Edmilson Martins
Não faltam nos dias hoje
protestantes que, não satisfeitos em torcer as palavras das Sagradas
Escrituras, também torcem os ensinamentos dos Santos Padres.
Surpreendentemente vez ou outra vemos
algum utiliza os Santos Padres (como Santo Agostinho, Santo Irineu, Santo
Atanásio, etc), para justificar a heresia e a falácia logica da Sola Scriptura
protestante.
A caricatura de Santo
Agostinho, criada por Lutero e os demais protestantes, não leva em conta o
contexto de suas afirmações. Para Santo Agostinho, o Evangelho e a Igreja
Católica, permanecem juntos, isto é o Evangelho é sempre recebido no contexto
da pregação católica. Não poderia ser de outra forma para os Santos Padres que
de forma alguma defendiam um Cristianismo multi-institucional. Desta forma, o
testemunho das Escrituras para Santo Agostinho, é sempre “auto-evidente”, mas
somente para “fieis” católicos, aqueles que já desenvolveram consciência
espiritual, e isto é apenas possível dentro da Igreja. Origenes, insistiu
fortemente no fato, das Escrituras serem interpretadas dentro da Igreja e para
a Igreja.
Os Santos Padres, não ensinaram
a suficiência absoluta das escrituras, mas sim sua suficiência material e
formal. Quando Santo Agostinho, Santo Atanásio ou qualquer outro afirma a
suficiência das Escrituras, sua autoridade para resolver disputas, não estão de
forma alguma pretendendo “absolutizar” as Escrituras como única e imediata
regra de fé do cristão, mas sim se referindo a elas como forma mediata da fé. É
absurdo, anacrônico, um protestante interpretar estas afirmações dos Pais,
tendo em unicamente em vista a doutrina protestante desenvolvida apenas no
século XVI.
Dessa forma alguns fazem uma
leitura viciada dos Santos Padres, citam Santo Irineu, mas ignoram o fato do
mesmo ter afirmado:
"Quando, contudo, eles
foram refutados pelas Escrituras, voltaram atrás e acusaram essas mesmas
Escrituras, como se elas não fossem corretas, nem tivessem autoridade, e
afirmaram que elas são ambíguas, e que a verdade não pode ser retirada delas
por aqueles que não conhecem a tradição... Aconteceu, portanto, que aqueles
homens agora nem concordam com as Escrituras nem com a tradição" (Contra
as Heresias III,2,1).
"Suponhamos que se levante
uma questão sobre algum importante ponto entre nós, e não possamos recorrer às
mais primitivas comunidades com as quais os apóstolos mantiveram constante
relacionamento, as quais aprenderam deles o que é certo e claro a respeito
dessa questão. O que aconteceria se os próprios apóstolos não nos tivessem
deixado escritos? Não seria necessário (nesse caso) seguir o curso da tradição
que transmitiram àqueles aos quais entregaram às Igrejas?"
Afirma também Tertuliano:
"Erros de doutrina nas
comunidades eclesiais devem ter surgido necessariamente sobre vários assuntos.
Quando, contudo, se encontrava de forma unânime e igual aquela doutrina que
fora passado a muitos, não era resultado de um erro, mas da tradição. Pode
alguém, então, ser tão irresponsável que diga que aqueles que receberam a
tradição estavam em erro?" (Prescrição contra os Hereges, 28)
Segundo Tertuliano claro nesta
passagem, que Tradição da Igreja, é critério e fonte de fé, na resolução de
disputas. Ao coro de vozes junta-se a de
São Gregorio de Nissa, que confirma mais uma vez:
"Pois é suficiente para
provar nossa afirmação de que a Tradição veio até nós por nossos pais,
transmitida como uma herança, por sucessão dos apóstolos e dos santos que os
sucederam. Aqueles, por outro lado, que mudaram suas doutrinas com novidades,
necessitariam do suporte de abundantes argumentos, se quisessem mostrar seus
pontos de vista, não à luz de homens controversos e instáveis, mas de homens de
peso e firmeza. Mas já que suas posições se apresentam sem fundamentos e sem
provas, quem é tão louco e tão ignorante para considerar os ensinamentos dos
evangelistas e apóstolos, e daqueles que sucessivamente brilharam como luzes
nas igrejas de menos força do que tais coisas sem sentido e sem provas?"
(Contra Eunômio, 4,6)
O irmão de São Gregorio de
Nissa, São Basilio Magno, acompanha o irmão nesta verdade tão cristalina da fé
cristã:
"Sobre os dogmas e
querigmas preservados pela Igreja, alguns de nós possuímos ensinamento escrito
e outros recebemos da tradição dos Apóstolos, transmitidos pelo mistério. Com
respeito à observância, ambos são da mesma força. Ninguém que seja versado
mesmo um pouco no proceder eclesiástico, deverá contradizer qualquer um deles,
em nada. Na verdade, se tentarmos rejeitar os costumes não escritos como não
tendo grande autoridade, estaríamos inconscientemente danificando os Evangelhos
em seus pontos vitais; ou, mais ainda, estaríamos reduzindo o querigma a uma
única expressão" (O Espírito Santo, 27,36).
Tomar citações de determinados
Padres isoladamente, fora da mente dos próprios, fora da mente da Igreja é
cometer um gravíssimo erro. Os Santos Padres, individualmente, não são
infalíveis, mas seus apelos são dignos de fé quando ecoam no ensinamento
Universal da Igreja. É o chamado Consensus Patrum. A Tradição Apostólica, não é
apenas uma memoria histórica, e seu verdadeiro sentido, NÃO PODE simplesmente
ser estabelecido unicamente por meio de uma pesquisa histórica. Quem percorre
esse caminho, normalmente cai nos mais diversos tipos de erros gravíssimos.
Com isso fica claro, que
Irineu, não pensavam em uma leitura das Escrituras que ignorasse o Kerigma
Ekklisiastikon, a Tradição da Igreja, mas sim tinha vista uma leituras das
Escrituras na Igreja e pela Igreja, levando em conta essa mesma Tradição como
fonte da fé, que poderia sozinha suprir a Igreja caso a Providencia Divina não
legasse as Escrituras como um auxilio. Ignoram o simples fato, que aquilo que
anima a Igreja, que guia sua ação no mundo, não são as Escrituras em si, mas o
Espirito Santo, o Paraclito prometido por Cristo, que ensina e desenvolve a
Palavra de Deus por meio do Magistério da Igreja.
É simplesmente impossível,
contar unicamente com as Escrituras, na solução de TODAS as questões de cunho
dogmático. Bom seria, se no mundo dos fatos, ler as escrituras fosse suficiente
para depreender o verdadeiro sentido
delas, mesmo quando desconexas Kerigma cristão, da Tradição da Igreja. Não
haveria nenhuma seita dita cristãs para dizer toda a espécie de heresias e
blasfêmias (coisa corrente desde o
primeiros séculos do cristianismo). Tolice seria condenar o papel da Tradição
no desenvolvimento dogmático e exposição da verdade Cristã. Insanidade maior e
hipocrisia, seria negar validade do Magistério no desenvolvimento dogmático de
determinado dado revelado, tanto na Tradição quanto nas Escrituras.
A história da Igreja testifica
o papel fundamental que a Tradição Apostólica, teve na exposição de uma
doutrina cristã verdadeiramente ortodoxa de acordo com a Revelação, a Fé dos
Apóstolos.
No passado os arianos, como
todos os demais grupos dissidentes, preparam um incrível rol de estudos e
citações das Escrituras, para combater a ortodoxia dos Padres. Desejam prender
o debate no campo das Escrituras, somente. Não estavam preocupados com o
contexto das citações, na Revelação como um todo.
Santo Atanásio (citado
equivocamente por alguns hereges protestantes), pelo contrario, apelava para a
Mente da Igreja, para o Escopo da Fé, como regra interpretativa das Escrituras.
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