Mas o que odeia o bem, o Inimigo assombrado de que
depois de todos os golpes ainda tivesse valor para voltar, chamou seus cães e arrebatado
de raiva disse: “Vejam vocês que não pudemos deter esse tipo nem com o espírito
de fornicação nem com os golpes; ao contrário, chega até a desafiar-nos. Vamos
proceder contra ele de outro modo”.
A função de malfeitor não é difícil para o demônio. Essa noite, por isso, fizeram tal estrépito que o lugar parecia sacudido por um terremoto. Era como se os demônios abrissem passagens pelas quatro paredes do recinto, invadindo impetuosamente através delas em forma de bestas ferozes e répteis. De repente todo o lugar se encheu de imagens fantasmagóricas de leões, ursos, leopardos, touros, serpentes, víboras, escorpiões e lobos; cada qual se movia segundo o exemplar que havia assumido. O leão rugia, pronto a saltar sobre ele; o touro, quase a atravessá-lo com os chifres; a serpente retorcia-se sem o alcançar completamente; o lobo acometia-o de frente. E a gritaria armada simultaneamente por todas essas aparições era espantosa, e a fúria que mostravam, feroz.
Antônio, atormentado e pungido
por eles, sentia aumentar a dor em seu corpo; no entanto, permanecia sem medo e
com o espírito vigilante. Gemia, é verdade, pela dor que atormentava seu corpo,
mas a mente era senhora da situação e, como por debique, dizia-lhes: “Se
tivessem poder sobre mim, teria bastado que viesse um só de vocês; mas o Senhor
lhes tirou a força e por isso se esforçam em fazer-me perder o juízo com seu
número; é sinal de fraqueza terem de imitar animais ferozes”. De novo teve a
valentia de dizer-lhes: “Se é que podem, se é que receberam poder sobre mim,
não se demorem, venham ao ataque! E se nada podem, para que esforçar-se tanto
sem nenhum fim? Porque a fé em Nosso Senhor é selo para nós e muro de salvação”.
Assim, depois de haver intentado muitas argúcias, rangeram os dentes contra
ele, porque eram eles próprios que estavam ficando loucos e não ele.
De novo o Senhor não se
esqueceu de Antônio em sua luta, mas veio ajudá-lo. Pois quando olhou para
cima, viu como se o teto se abrisse e um raio de luz baixasse até ele. Foram-se
os demônios de repente, cessou-lhe a dor do corpo, e o edifício estava
restaurado como antes. Notando que a ajuda chegara, Antônio respirou livremente
e sentiu-se aliviado de suas dores. E perguntou à visão: “onde estavas tu? Por
que não aparecestes no começo para deter minhas dores?” E uma voz lhe falou: “Antônio,
eu estava aqui, mas esperava ver-te enquanto agias. E agora, porque agüentaste
sem te renderes, serei sempre teu auxílio e te tornarei famoso em toda parte”.
Ouvindo isto, levantou-se e orou: e ficou tão fortalecido que sentiu seu corpo
mais vigoroso que antes.
(Vida de Santo Antônio do
Deserto, 9-10)
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