LIÇÃO 1: 2 TESSALONICENSES 2,1-5
Admoestamo-los a não
apartar-se da verdade, como se o dia do juízo estivesse próximo, porque
primeiro há de dar-se a conhecer o Anticristo, que São Paulo chama o homem do
pecado.
1 Entretanto, irmãos,
vos suplicamos, pelo advento de Nosso Senhor Jesus Cristo, e de nossa união à
Ele.
2 que não abandoneis rapidamente vossos sentimentos, nem os assusteis com
supostas revelações, com certos discurso, ou com cartas que se suponham
enviadas por nós, como se o dia do Senhor estivesse muito próximo.
3 Não deixai-vos seduzir por nada e de nenhum modo, porque não virá este dia
sem que primeiro haja acontecido a apostasia geral dos fiéis, e aparecido o
homem do pecado, o filho da perdição,
4 o qual se oporá à Deus e se levantará contra tudo o que se diz Deus, ou se
adora, até chegar a por seu assento no templo de Deus, dando-se a entender que
é Deus.
5 Não vos recordais
que, quando estava entre vós, vos dizia estas coisas?
No capítulo anterior o
Apóstolo correu o véu aos acontecimentos futuros no que mostra as penas dos
maus e o prêmio dos bons; aqui anuncia os perigos que correrá a Igreja no
tempo do Anticristo; e primeiro anuncia a verdade desses perigos futuros,
e exórta-os logo a permanecer na verdade. Quanto ao primeiro, excluída a falsidade,
os instrui na verdade. Traz-lhes também a consideração à (tripla) razão que
servirá para persuadí-los, e a que: "a não deixar-se alterar tão
facilmente"; e toma do meio que pudera abordá-los. Induze-os, não com
mandatos (Fil 1) senão com seus próprios rogos: "os suplicamos". Pelo advento de
Cristo, embora terrível para os maus (Am 5), desejável para os bons (2Tm 4; Ap
22); Pelo desejo e amor de toda a congregação dos Santos, "nele mesmo", e à saber, onde está Cristo,
porque"onde está o corpo, ali se
juntarão as águias"(Mt
24). Ou nele mesmo, porque todos os Santos, em lugar e glória, estarão no
mesmo, segundo o mesmo: "junta-lhe
seus santos". Mas a que os
induz? "a que não mudeis de ligeiro
vossos sentimentos".
Mas uma coisa é mover-se e outra ser presa do terror. Move-se de seu sentir
quem deixa o que teve; como se dissera: não deixes tão rapidamente minha
doutrina.“Quem pronto crê é cabeça leviana” (Eclo. 19). Mas o terror é
um gênero de trepidação, como o medo do contrário. Por isso disse: "nem os aterrorizeis", como o ímpio, em cujos ouvidos"soa sempre um estrondo que lhe aterra" (Jó 15,21). Também se houver
paz, é suspeita sempre ciladas e traições, "pois sendo como é medrosa a maldade, traz
consigo o testemunho de sua própria condenação" (Sab 17,10).
-a)"com supostas revelações". Dá de mão ao que poderia
movê-los, em especial e no geral:"que
nada os seduza"; e é um seduzido ou
enganado por uma falsa revelação; donde diz:"com
supostas revelações" ou
pelo espirito, isto é: se alguns disserem que o Espírito Santo revelou-lhe algo
de encontro a minha doutrina, "não os aterrorizeis" (1Jo 4; Ez.
13). Algumas vezes também Satanás transfigura-se em anjo de luz, como se
diz em 2Co 11 e 3 Reis,22:"sairei e serei
um espirito mentiroso na boca de todos seus profetas"; b) por um raciocínio
ou falsa exposição da Escritura; por isso diz: "com certos discursos" (2Tm 2; Ef
5); c) por uma autoridade distorcida a um perverso sentido."Segundo que também nosso caríssimo irmão
Paulo os escreveu conforme à sabedoria que lhe foi dada, como o faz em todas
suas cartas... nas quais há algumas coisas difíceis de entender, cujo sentido
os indoutos e inconstantes pervertem, da mesma maneira que nas demais
escrituras de que abusam, para sua propria perdição" (2 Pedro,3,16). Mas sobre o
que versava o engano?: "como se o dia do Senhor estivesse já muito
próximo". E adiciona: "ou
com cartas que se supunham enviadas por nós"; porque na Primera Carta, se mal
se entende, parece dizer que a vinda do Senhor está já à porta, como
aquilo: "logo nós os que vivemos... "
Diz o mesmo no
geral: "que nada os engane de nenhum
modo" (Lc 21; 1Co 15).
A razão pela qual o Apóstolo tira do meio estas “pedras de tropeço”, é porque o prelado por nenhum
motivo há de querer que valendo-se de mentiras se consigam alguns bens.
"A mais disso,
somos convencidos de testemunhos falsos" (1Co 15,15). Assim mesmo porque a coisa crida era perigosa: que se
aproximava a chegada do Senhor. Primeiro, porque se daria ocasião a maior
engano, já que haveriam alguns, depois de mortos os Apóstolos, que diriam serem
eles o Cristo (Lc 21). Por isso o Apóstolo não quis que houvesse lugar a
dúvidas. Também porque o demônio pretende com frequência fazer-se passar por
Cristo, como consta na Vida de São Martinho; e não quis que os Tessalonicenses
passasem pelo mesmo. Santo Agostinho põe outra razão: porque correria perigo a
fé; pois algum diria: tardará em vir o Senhor, e então me prepararei para recebê-lo.
Outro: logo virá, agora vou-me preparar. Outro, enfim: não sei; e este está
mais no justo, porque concorda com o que diz Cristo.
Mas o que vai mais
errado é o que diz: logo, porque, passado o fim da pregação, os homens
entrariam em desespero e creriam que fosse falso o que estava escrito.
Estabelece logo a
verdade, ao dizer: "porque não virá este dia sem que primeiro haja
acontecido a apostasia"; e mostra primeiro o que acontecerá à vinda
Anticristo, que são duas coisas: uma anterior à sua vinda; outra, a sua mesma
vinda. Primeiro está a apostasia, que a Glosa explica de muitas
maneiras, e primeiro da fé, que, segundo estava anunciado (Mt 24), todo o
mundo a receberia. Esta é, pois o sinal precursor, que -segundo Santo
Agostinho- ainda não se cumpre; depois dela haverá muitos apóstatas (1Tm 4)
"e pela inundação dos vícios se resfriará a caridade de muitos" (Mt
24,12).
Ou entenda-se a
apostasia ou separação do Império Romano, ao que todo o mundo estava submetido.
Segundo Santo Agostinho, figura sua era a estátua de Daniel, em cujo capítulo dois
se nomeiam quatro reinos, os quais terminariam no acontecimento da vinda de
Cristo; e que isto era um sinal a propósito, porque a firmeza e estabilidade do
Império Romano estava ordenada a que, debaixo de sua sombra e senhorio se
ensinasse por todo o mundo a fé cristã. Mas como pode ser isto, sendo já
passados muitos séculos desde que os Gentios se apartaram do Império Romano e,
isso não obstante, não havia vindo ainda o Anticristo? Digamos que o
Império Romano ainda segue em pé, mas mudada sua condição de temporal em
espiritual, como disse o Papa São Leão em um sermão sobre os
Apóstolos. Por conseguinte, a separação do Império Romano há de
entender-se, não só na ordem temporal, senão também na espiritual, e, a
saber, da fé católica da Igreja Romana. E isto é um sinal muito a
propósito, porque, assim como Cristo veio quando o Império Romano senhoreava
sobre todas as nações, assim pelo contrário o sinal do Anticristo é a separação
dele ou apostasia.
Prediz em segundo
lugar ao Anticristo, quanto a sua culpa e pena, que toca implícitamente e em
comum, e seguidamente explica, e quanto ao seu poder. Disse pois: primeiro virá
a apostasia e então se deixará ver. E chama-se "o homem do pecado,
o filho da perdição", segundo a Glosa, porque assim como em Cristo abundou
a plenitude da virtude, assim também no Anticristo a multidão de todos os
pecados; e assim como Cristo é melhor que todos os santos, assim o Anticristo
pior que todos os maus. Por isto se chama o homem do pecado, porque ele todo,
dos pés a cabeça, será um puro pecado. Mas isto não quer dizer que não pudesse
ser pior, porque o mal jamais corrompe totalmente o bem, conquanto ao ato não
poderá ser pior; contudo melhor que Cristo nenhum homem. Disse-se "o
filho da perdição", isto é, destinado à perdição final (Jó 21). O
filho da perdição, isto é, do diabo, não por natureza, senão pela malícia
acabada, que nele se acumulará. E disse: "se fará manifesto";
porque assim como todos os bens e virtudes dos santos, que precederam à Cristo,
foram figura de Cristo; da mesma maneira em todas as perseguições da Igreja os
tiranos foram como figura do Anticristo no que ele estava latente; e assim toda
aquela malícia, que estava escondida neles, se fará patente a seu tempo.
Ao dizer logo: "no qual se oporá à Deus", explica o que havia dito , e
demonstra como é o homem do pecado e como é filho da perdição. Assim mesmo
prenuncia sua futura culpa, que descreve e demonstra e indica sua causa, e diz
que não anuncia nenhuma doutrina nova. Da também um sinal dessa culpa, que é duplo,
a saber, a oposição contra Deus e o preferir-se a Cristo. De onde
diz: "que faz oposição" a todos os espíritos bons
(Jó 15; Is 3) e "se levantará contra tudo o que se
diz Deus". E diz-se Deus de
três maneiras: a) por natureza."Escuta,
Israel, o Senhor teu Deus é um só Deus" (Deut. 6); b) na opinião dos povos."Todos os deuses dos Gentios são
demônios" (Sl. 95). c) por
participação. "Eu disse: sois deuses "(Sl. 81). E a todos estes
prefere-se o Anticristo,"e
se levantará soberbo e insolente contra todos os deuses; e falará com
arrogância contra o Deus dos Deuses" (Dan. 11,36).
(nt. do tradutor:
quanto à relação a não anunciar nenhuma doutrina nova, Santo Tomás está se
referindo ao Apóstolo São Paulo e não ao Anticristo. Como pode se notar no
último parágrafo desta parte da tradução *)
Sinal de sua culpa é o
que diz: "até chegar a por seu assento no
templo de Deus"; pois a soberba do
Anticristo avantaja em muito a de todos os que lhe precederam. Porque assim
como se lê de Caio César que quis em vida pusessem em todos os templos uma
estátua sua e lhe dessem culto; e do rei de Tiro se diz em Ezequiel 28: "eu sou Deus"; assim é crível o faça o
Anticristo chamando-se Deus e homem; e na prova disso se sentará no templo. Mas
em que templo?
Acaso não foi destruído
pelos Romanos? Por isso dizem alguns que o Anticristo é da tribo de Dan, que
não se nomeia entre as outras doze (Ap 7); e por isso também os Judeus o
receberam primeiro, e reedificaram o templo em Jerusalém, e assim se cumprirá o
de Daniel 9,27: "e estará no templo a abominação da desolação" (Mt
24). Mas alguns dizem que nunca será reedificada Jerusalém, nem o templo, senão
que durará a desolação até a consumação no fim do mundo. Crença que admitem
também alguns Judeus; por isso a explicação que dão de "no templo de
Deus" a referem à Igreja, porque muitos eclesiásticos o
receberão. Ou, segundo Santo Agostinho, se sentará no templo de Deus, isto
é, exercerá seu principado e senhorio, como se fosse ele mesmo com os seus o
templo de Deus, como Cristo o é com os seus.
Mostra que nada novo
escreve, ao dizer: "não vos recordais que, quando estava todavia entre
vós, vos dizia estas coisas?"; como se dissera: já antes, estando
convosco, havia vos dito (1Jo 2; 2Co 10).*
LIÇÃO 2: 2 TESSALONICENSES 2,6-9
Põe-se de manifesto a morte do Anticristo, e declara-se a demora de sua vinda.
6 Vós já sabeis a
causa que agora o detém, até que seja manifestado a seu tempo.
7 O fato é que já vai obrando o mistério da iniquidade; entretanto, o que está
firme agora mantenha-se até que seja tirado o impedimento
8 E então se deixará
ver aquele perverso, a quem o Senhor Jesus matará com o alento de sua boca e
destruirá com o resplendor de sua presença
9 aquele iníquo que
virá com o poder de Satanás, com toda sorte de milagres, de sinais e falsos
prodígios,
10 e com todas as
ilusões que podem conduzir à iniquidade àqueles que se perderam, por não haver
recebido e amado a verdade a fim de salvarem-se.
Chega o Apóstolo,
anunciando o futuro, contou a chegada e culpa do Anticristo; aqui nos mostra a
causa que impede essa vinda; e primero descobre que eles já sabem a que causa
se refere, e a propõe em termos obscuros. Assim pois: digo que é necessário se dê
a conhecer o homem do pecado. "Já sabeis vós a causa que agora o
detém", isto é, a causa de que se tarda, porque eu já lhes disse, de
sorte que o que ao presente lhe detém, "a seu tempo",
isto é, oportunamente, "se dará a conhecer" (Ecle.8).
-"O fato é que já vai obrando ou tomando forma
o mistério da iniquidade". Explica por que se demora o Anticristo; e este texto temmuitas interpretações, porque mistério pode estar
em nominativo ou acusativo. No primeiro caso o sentido
é este: digo que a seu tempo se dará a conhecer, porque ainda o mistério, isto
é, - figuradamente ocultado (enigmáticamente proposto), já está obrando
nos fingidos (cristãos), que parecem bons, e na realidade são maus, e estão
fazendo o ofício do Anticristo,"mostrando,
sim, aparência de piedade, mas renunciando ao seu espírito" (2Tm 3,5). No segundo
caso, ou no acusativo, se interpreta assim: porque o diabo, em cujo poder
permanecerá o Anticristo, já começou ocultamente, por meio dos tiranos
eenganadores, a cometer suas iniquidades; porque as perseguições à Igreja deste
tempo são figuras dessa última perseguição contra todos os bons e, em
comparação com aquela, são como a cópia respectiva da original."Entretanto o que está firme agora". Isto também tem múltipla
explicação. Uma -segundo Santo Agostinho e a Glosa- diz que, na opinião de
alguns, o Anticristo é Nero, o primeiro perseguidor dos cristãos, que não foi
morto, senão roubado fraudulentamente, e que algum dia será restituído em seu
lugar. Donde o Apóstolo, dando por vã esta opinião, diz:"entretanto o que está firme agora", tendo em suas mãos o
Império, "mantenha-se, até que seja tirado
o impedimento", isto é, até que morra. Mas explicado desta maneira não cai bem, porque há muitos anos
que Nero está morto, à saber, o mesmo ano que o Apóstolo. Refere-se melhor
a Nero, como pessoa pública do Império Romano, até que seja tirado do meio,
isto é, o Império Romano, deste mundo (Is 23,9: foi o Senhor dos Exércitos que o decidiu, para
fazer murchar o orgulho de tudo que se honra).
Ou de outro
modo: "entretanto o que tem", isto é, detem agora a
chegada do Anticristo, detenha-o para que não venha; qual se fosse necessário
que alguns venham todavía à fé e alguns se apartem dela, como se dissera: para
deixar franquia à porta a ires e vires, entradas e saídas, o que agora detém
até que venha detenha até que seja tirado do meio este homem obsceno. Ou também
assim: entretanto o que tem agora fé tenha-a, isto é, mantenha-se firme nela
(Ap 2). Até que seja tirado do meio, isto é, a reunião revoltosa de maus, se
separe dos bons e se ponha aparte, como se fará na perseguição do Anticristo.
Ou entretanto... isto é, que o mistério de iniquidade, a
iniquidade misteriosa, que detém, detenha, até que a removam de seu esconderijo
ao centro da praça, à vista do público; pois muitos pecam agora às ocultas, mas
chegará o dia no qual farão à luz do dia;porque Deus suporta os pecadores
enquanto às ocultas cometem seus pecados; mas o dia em que encontrarem o
limite, então se lhe acabará a paciência, como sucedeu com os
Sodomitas. Com tudo isso, Santo Agostinho confessa ignorar o que é o que o
Apóstolo lhes diz, se já o sabiam; por isso diz: "já sabéis o que
agora detém". Ademais não era coisa muito necessária de saber-se.
Ao dizer logo: "e então se deixará ver", põe-se a chegada do iníquo e sua
pena; primero sua manifestação, logo sua pena. Quanto ao primeiro diz: aquele,
o único, iníquo, perverso, se deixará ver, porque sua culpa se fará patente,
"a quem o Senhor Jesus matará com o alento de sua boca". - "O zelo do Senhor dos exércitos é o que fará
estas coisas" (Is 9,7), isto
é, o zelo da justiça, que é amor; porque o espírito de Cristo é o amor de
Cristo, e este zelo é o que o Espírito Santo tem para com a Igreja. Ou com o
alento de sua boca, isto é, por ordem dela; porque São Miguel lhe dará morte no
Monte das Oliveiras, de onde Cristo subiu aos céus. De sorte parecida encontrou
seu fim Juliano o Apóstata, executado por mão divina. E esta é a pena presente,
embora também será castigado com a eterna, porque "o destruirá com o resplendor de sua
presença", isto é, com sua
chegada que tudo o porá como um sol (1Co 4). E o destruirá, digo, com a eterna
condenação (Sl. 27). Diz também resplendor, porque o Anticristo pareceu
encher de trevas a Igreja, e as trevas são desterradas pelos resplendores;
porque tudo o que o Anticristo dará a conhecer será demonstrado haver sido
engano. (Et dicit,illustratione,
quia ipse visus est Ecclesiam obtenebrare, et tenebrae expelluntur
illustratione, quia quicquid Antichristus ostenderit, ostendetur fuisse
mendacium.) trad. mendacium = mentira, invenção, disfarce.
No latim: (Et haec est
poena praesens, licet futura etiam aeternaliter punietur, quia destruet
illustratione, etc., id est, in adventu suo omnia illustrante. I Cor. IV,
5: illuminabit abscondita tenebrarum, et cetera. Et destruet,
inquam, aeterna, scilicet damnatione. Ps. XXVII, v. 5: destruet illos,
et cetera. Et dicit, illustratione, quia ipse visus est
Ecclesiam obtenebrare, et tenebrae expelluntur illustratione, quia quicquid
Antichristus ostenderit, ostendetur fuisse mendacium. Deinde cum
dicit eum cuius est adventus, praedicit potestatem Antichristi. Et
circa hoc duo facit, quia primo ponit potestatem eius ad seducendum; secundo
huius causam ex domini iustitia, ibi eo quod charitatem. Iterum
prima in tres, quia primo ponit actorem huius potestatis; secundo modum
seducendi; tertio ostendit seducendos. Actor huius potestatis est Diabolus, et
ideo destruet eum Christus)
-"aquele iníquo que virá com o
poder de Satanás".
Prediz o poder do Anticristo, para seduzir, e a causa deste poder de sedução, a
justiça do Senhor, "por não haver
recebido e amado a verdade para salvar-se os que pereceram". Põe também ao autor deste poder,
o modo de seduzir, os seduzidos ou enganados. O autor deste poder é o diabo;
por isso Cristo o destruirá, que para isso veio, "para desfazer as obras do diabo" (1Jo 3,8). Por isso diz que
o Anticristo "virá com o poder de Satanás", isto é, governará por instigação
diabólica. "Será solto Satanás de sua prisão,
e sairá e enganará as nações" (Ap 20,7). Pois das obras que fará algumas serão segundo a
operação de Satanás, como as do endemoninhado ou possuído, em quem não só
instiga a vontade senão ainda impede o uso da razão; em cujo caso não se lhe
imputa a culpa, porque não usa de seu arbítrio.Mas o Anticristo não será assim,
porque usará de seu arbítrio, e dentro dele estará o diabo instigando-lhe, como
se disse de Judas (Jo 13,27).
E enganará desta
maneira: primeiro valendo-se do poder secular; segundo, da força dos
milagres. Quanto ao primeiro diz:"com toda sorte de milagres",
a saber, do mundo. "Se fará dono dos tesouros de ouro e de prata e
de todas as preciosidades de Egito"(Dan. 11,43). Ou com virtude
fingida. Quanto ao segundo diz: "de sinais". Os sinais são uma
espécie de "milagretes".* Os prodígios, entretanto são grandes, que
demonstram que uma pessoa é um ser prodigioso, como quem diz à distância: distante,
em dígitos: do dedo (Ap 13). E diz: "falsos prodígios".
Chama-se falso um milagre, ou porque lhe falta a verdadeira razão do fato, ou a
verdadeira razão do milagre, ou o devido fim do milagre. O primeiro é o
que fazem os ilusionistas, melhor dito, o que se faz por arte de magia e
bruxaria, quando o diabo se encarrega de dar “gato por lebre” para
que pareça outra coisa do que é; como fez Simão Mago com um carneiro que mandou
degolar, que logo se deixou ver vivo; ou com um homem, que todos criam degolado
e, por haver-lhe visto logo vivo, creram-lhe ressuscitado. E isto fazem os
homens fazendo fantasmas na imaginação para enganar.
*No latim: Prodigia vero magna, quae aliquem prodigiosum ostendunt,
quasi procul a digito.(como se medisse a dedo) Ap. XIII, 13: fecit
signa magna, ita ut et ignem faceret descendere de caelo, et cetera. Matth.
XXIV, 24: dabunt signa magna et prodigia, ita ut in errorem inducantur,
si fieri potest, etiam electi.
Procul (latim): à distância , ao longe, de longe
A segunda espécie de
milagres, impropriamente chamados assim, são os que despertam grande admiração,
por ver-se o efeito, sem conhecer-se sua causa. Assim pois"os
milagres", que tem não simplesmente sua causa oculta, senão para algum
oculta, dizem-se não simplesmente milagres, senão maravilhas. Mas os que tem
simplesmente sua causa oculta são propriamente milagres, cujo autor é o mesmo
glorioso Deus, porque estão acima de toda a ordem da natureza criada. Mas
algumas vezes se fazem algumas maravilhas, cujas causas estão ocultas, mas não
fora da ordem da natureza; e isto com mais razão o fazem os demônios, que
conhecem as virtudes da natureza e tem determinada eficácia para especiais
efeitos; e estas fará o Anticristo, mas não as que tem verdadeira razão de
milagre, porque não tem poder naquilo que está sobre a natureza.
Dizem-se milagres em
terceiro lugar os que estão ordenados a servir de testemunho à verdade da
fé, ou a subtrair os fiéis a Deus, como se diz em São Marcos. Mas se algum
tivesse a graça de fazer milagres, e não se valesse deles para este fim, os milagres
seriam verdadeiros quanto à razão do fato e à razão do milagre; mas seriam
falsos quanto ao devido fim e à intenção divina.
Mas isto não sucederá
com o Anticristo, porque ninguém faz verdadeiros milagres contra a fé, já que
Deus não é testemunha de falsidades. Donde um que ensine uma falsa doutrina não
pode fazer milagres, embora um homem de má vida bem o poderia.
Logo sinala aos que se
deixaram enganar, ao dizer: "àqueles que se perderam",
isto é, aos destinados à perdição. "Nenhum deles tem perecido senão
o filho da perdição". E isto precisamente porque "minhas
ovelhas ouvem minha voz" (Jo 10).
LIÇÃO 3: 2
TESSALONICENSSES 2,10-16
O Anticristo seduzirá
aos que não tem caridade; por isso há que pedir à Deus que se digne chamar-nos
e não permita que nos apartemos da verdade.
11 Por isso Deus lhes enviará ou permitirá que obre neles o artifício do
erro, com que creiam na mentira,
12 para que sejam condenados todos os que não creram na verdade, mas que se
comprazeram na maldade
13 Mas nós devemos sempre dar graças à Deus por vós, irmãos amados de Deus,
por Deus havê-los escolhido por primícias de salvação, mediante a santificação
do espírito e a verdadeira fé que lhes foi dada;
14 na qual os chamou assim mesmo por meio de nosso Evangelho, para fazê-los chegar
a glória de Nosso Senhor Jesus Cristo.
15 Que assim, meus irmãos, ficai firmes e mantenham as tradições que haveis
recebido, ora por meio da pregação, ora por carta nossa.
16 E Nosso Senhor Jesus Cristo, e Deus, nosso Pai, que nos amou, e deu eterno
consolo, e boa esperança pela graça,
17 alente vossos corações e os confirme em toda obra e palavra boa.
Depois de indicar a quem seduzirá o Anticristo, à saber, os destinados à
condenação, aqui explica o porque do dito e como serão seduzidos; os fiéis,
pelo contrário, como serão livrados. Assim mesmo indica só sua culpa, a pena
com a culpa, só a pena. E este é o passo-a-passo com que procede o pecado: que
primeiro é um desamparado da graça pelo demérito do primeiro pecado, e cai em
outro pecado (porque um abismo chama a outro abismo), e por último na
condenação eterna.Disse pois que a causa pela qual serão enganados é o não
haver recebido e amado a verdade, isto é, a verdade do Evangelho (Jo 8; Jó 24);
e diz: "caridade da verdade", porque, ao não estar informada a
fé pela caridade, não tem nenhum valor (1Co 13; Gal. 6). E acrescenta o
proveito que trai a verdade dizendo: "a
fim de salvar-se" (Rm
5).Mas, por culpa de não haver recebido a verdade, a pena será seu engano; de
donde diz: "enviará", isto é, permitirá que obre
neles "o artifício do erro" (Is 19; 3 Reis 22). Por
isso diz: "com que creiam na mentira", isto é, na falsa doutrina
do Anticristo (Rm 1). Mas a pena é a eterna condenação; donde
acrescenta: "para que sejam condenados", com sentença de condenação (Jo
5), "todos os que não creram na
verdade" (Jo 3).
Ao dizer logo: "mas nós", mostra porque os fiéis de Cristo
se verão livres; da graças por eles e relembra a memória dos benefícios
divinos, pelos quais se veêm livres desses males. Diz pois assim: eles serão
enganados, mas "nós devemos dar graças" (Rm 1). E recorda dois
benefícios divinos, à saber, a eleição de Deus, que é eterna, e a vocação, que
é temporal. Disse pois: "porque
nos elegeu" a nós, os
Apóstolos, "e a vós", os fiéis (Ef 1; Jo 15). Toca em
três pontos na matéria da eleição, à saber, na ordem dos eleitos, no fim da
eleição e no meio de conseguir o fim. Todos os santos tem sido eleitos desde o
princípio do mundo (Deut. 33); mas as primícias de modo especial são os Apóstolos
(Rm 8). Por isso diz: "primícias da
fé". Assim mesmo o fim da
eleição é a salvação eterna, como diz: "para
a salvação" (1Tm 2). E isto
se leva à efeito primeiro, da parte de Deus, por meio da graça santificante;
donde diz:"mediante a santificação do
espírito"; segundo, da parte
nossa, com o consentimento de nossa vontade por meio da fé; por isso
acrescenta: "e na verdade da fé ".
-"à qual os
chamou". Põe o segundo benefício, que é a vocação temporal de Cristo,
que segue-se à eleição (Rm 8). E sobre esta vocação repara na parábola do que
fez a grande ceia (Lc 14)"por meio de nosso Evangelho" pregado
por mim. Mas a qual ceia nos convida? "para fazer-nos chegar a
glória", isto é, para que alcancemos a glória de Cristo.
Logo, quando
diz: "assim que, meu irmãos", os admoestam a manterem-se
firmes na verdade e interpõe a oração para este fim. E faz o primeiro, porque
nuestras obras dependem de nossa vontade, e o segundo, porque é necessário o
auxílio da graça.
E primeiro admoesta-os
a estarem firmes (Gl 5); ensina logo o modo de está-lo: "e
mantenham as tradições", isto é, os ensinamentos que receberam de seus
maiores; porque os que se recebem dos menores algumas vezes não tem de ser
observados, à saber, quando se opõe aos ensinamentos da fé (Mt 15); mas sim
quando dizem respeito aos mandamentos divinos, "que haveis
aprendido". "Recomendavam aos fiéis a observância das
tradições e decretos acordados pelos Apóstolos e os presbíteros que residiam em
Jerusalém" (At 16,4). E estas tradições de duas maneiras lhes
deram à conhecer: umas com palavras; donde diz: "ora por meio da
pregação"; outras por escritos; por isso acrescenta: "ora
por carta nossa". Donde se põe de manifesto que haviam muitas coisas
na Igreja não escritas, que os Apóstolos ensinaram e, por conseguinte, hão que
se observar; pois muitas coisas - disse Dionísio -, a juízo dos Apóstolos, eram
melhor ocultá-las. Por isso disse o Apóstolo: "quanto ao mais já o
disporei quando lá chegar" (1Co 10). - "E Nosso
Senhor Jesus Cristo e Deus nosso Pai ...": Pondo esta frase, como se
dissesse: estas são minhas recomendações, mas de nada serve sem o auxílio
divino. Por isso põe primeiro um duplo benefício de Deus: o amor que nos tem e
pelo qual nos concede outras coisas; por isso diz:"nos amou";
e a consolação espiritual: "e deu eterno consolo" (2Co
1; Is 40). E diz consolo eterno, à saber, contra todos os males iminentes e
futuros. Por isso estamos na expectação de"uma boa esperança",
isto é, desses bens eternos que infalivelmente nos estão prometidos (1Pe. 1). E
isto "pela graça", pela qual esperamos conseguir a vida
eterna (Rm 6). Pede para eles uma exortação, que é uma admoestação encaminhada
a mover o ânimo a que queiram; e esta pode fazê-la o homem exteriormente; mas
não seria eficaz, se interiormente não o alentasse o espírito de Deus; donde
disse: "alente vossos corações", isto é, o mova. "Eu
a levarei à solidão e falar-lhe-ei ao coração" (Os 2). Assim
mesmo pede a confirmação; por isso diz: "e os confirme" (Sl.
67); como se dissesse: nos alente com sua graça para que queiramos, e nos
confirme para que eficazmente queiramos. E isto "em toda obra e
palavra boa". A obra leva a dianteira da palavra, porque Jesús começou
primeiro a obrar e depois ensinou.
Fonte:
http://www.clerus.org/bibliaclerusonline/pt/kcg.htm#n
Tradução: blog Cum Ex Apostalus Officio
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