terça-feira, 23 de outubro de 2012

O Drama do Fim dos Tempos – Parte 5 Final




NONO ARTIGO

novembro 1885

A CONVERSÃO DOS JUDEUS

A Santa Escritura nos assinala um grande acontecimento que se nos mostra entrelaçado na guerra que o Anticristo desencadeará contra a Igreja: a conversão dos judeus.

Deixamos este assunto de lado até aqui para tratá-lo com mais detalhes.Além disso, aqui ele estará muito bem colocado, pois a conversão dos judeus nos é apresentada como fruto da pregação de Elias.


I

O povo judeu é o ponto em torno do qual gira a história da humanidade. Ele recebeu o toque de Deus na pessoa de Abraão de onde saiu. É, antes da vinda de Nosso Senhor, o povo sacerdotal por excelência, cujo estado, no testemunho de Santo Agostinho, é inteiramente profético; dele nasceu a Santíssima Virgem e o Salvador do mundo; ele formou o núcleo da Igreja nascente. Todos esses privilégios fazem da raça judia uma raça excepcional cujos destinos são misteriosos.

Por uma inversão estranha e lamentável, no momento em que ela produz o Salvador do mundo, a raça eleita, a raça bendita entre todas merece ser condenada. Recusa reconhecer, em sua humildade, Aquele em quem ela não sabe adorar as grandezas invisíveis. Parece que Deus quis mostrar assim que não há nada da carne e do sangue na vocação do cristianismo, já que aqueles mesmos a quem pertencia o Cristo, segundo a carne (Rm 9, 5), são rejeitados por causa de seu orgulho tenaz e carnal.

Será uma condenação definitiva? Permanecerão presas de Satã excluídos do resto do mundo pela cruz do Senhor?  Deus não permita! Deus prepara supremas misericórdias para o povo que foi seu. A esse povo, a quem foi dito:

“Não sois mais meu povo”, será dito um dia:“Vós sois os filhos do Deus vivo”. (Os 3, 4-5). Depois de ter ficado longos anos sem rei, sem príncipe, sem sacrifício, sem altar,os filhos de Israel procurarão o Senhor seu Deus; e isso acontecerá no fim dos tempos. (Id. III, 4, 5) Elias será o instrumento dessa volta maravilhosa. “Eu vos enviarei, diz o Senhor em Malaquias, o profeta Elias, antes que venha o grande e terrível dia do Senhor. E ele voltará o coração dos pais para os filhos, o coração dos filhos para os pais” (Ml 4, 5-6).

Quer dizer, restabelecerá a harmonia  dos mesmos amores, das mesmas adorações entre os santos antepassados do povo judeu e seus últimos descendentes.

São Paulo insiste por sua vez sobre esse acontecimento tão consolador. Ele vê na condenação dos Judeus a causa ocasional da vocação dos Gentios. Depois acrescenta: “Porque eu não quero, irmãos, que vós ignoreis este mistério, que uma parte de Israel caiu na cegueira até que tenha entrado a plenitude das nações e então todo Israel se salve” (Rm 11, 25).

Tal é o desígnio de Deus. É preciso que toda a gentilidade entre na Igreja; e que, quando terminar o desfile das nações, Israel entre por sua vez. Este será o grande jubileu do mundo; a graça se espalhará por torrentes. Tomando as profecias ao pé da letra, todos os judeus que então estiverem vivos, ainda que numerosos como as areias do mar, serão salvos até o último (Rm 9, 27).

Para compreender os frêmitos profundos que esse grande acontecimento fará correr pelo mundo, é preciso usar as figuras proféticas pelas quais Deus houve por bem anunciá-lo.

O povo judeu entrando na Igreja, é Esaú se reconciliando com Jacob. Com que ternura! “Correndo ao encontro de seu irmão, Esaú abraçou-lhe o pescoço e beijando-o, chorou”.

Mas é sobretudo José reconhecido por seus irmãos que é o verdadeiro símbolo de Jesus reconhecido por seus irmãos, os judeus! Outrora venderam-no e crucificaram-no e agora uma imperativa necessidade de verdade e de amor leva-os a seus pés no fim dos tempos. Que encontro! Que espetáculo! Jesus, com todo o brilho de seu poder, desvendando aos judeus os tesouros de seu coração, e lhes dizendo: “Eu sou José, eu sou Jesus a quem vós vendestes!” (Gn 45).

Abri enfim o Evangelho, na página do filho pródigo (Lc 15). Esse pródigo que vem de tão longe são os pobres gentios entrando na Igreja. Os judeus são representados pelo filho mais velho, ciumento, egoísta, que se obstina em permanecer de fora porque seu irmão foi recebido em casa. O pai sai e lhe faz instantes rogos, coepit illum rogare. Esse desnaturado recusa escutar o pai; mas por fim o escutará, entrará e essa entrada trará alegria dobrada à casa paterna.

Não, não se pode imaginar qual será a alegria da Igreja quando ela abrir seu seio de mãe aos filhos de Jacó. Não se pode imaginar as lágrimas,  os transportes de amor destes quando  for retirado o véu de  seus olhos, reconhecerem seu Jesus. Qual será o momento preciso deste grande acontecimento? Esta é a dificuldade. Sem pretender resolvê-la, esperamos esclarecê-la um pouco.

Segundo a tradição, parece certo que o Anticristo será de nacionalidade judia. Ele aparecerá como o produto desta fermentação de ódio que há séculos exaspera o coração dos judeus contra  Jesus, seu terno irmão, seu incomparável amigo. Também parece certo que os judeus, em boa parte, acolherão esse falso messias seguindo-o em cortejo e lhe submetendo o mundo pela má imprensa e pela alta finança.

Mas desde o tempo que precederá o homem do pecado, se formará entre os judeus uma corrente de adesão à Igreja! Os grandes acontecimentos têm prelúdios que os anunciam.
São Gregório declara que o furor da perseguição do Anticristo cairá principalmente sobre os judeus convertidos a quem ninguém igualará na constância em suportar todos os ultrajes e todos os tormentos pelo nome mil vezes bendito de Jesus.

Esta passagem de São Gregório é muito importante para ser omitida. O grande papa explica uma das grandes profecias em ação de Ezequiel (Ez 3). É um drama em três atos. 1°) Deus ordena que o profeta saia para o campo; esta saída representa a difusão do Evangelho entre os gentios. 2°) Manda que volte para casa, onde é atado com cadeias, aprisionado e reduzido ao silêncio: isso indica como o Evangelho será pregado pelos judeus aos próprios judeus, dos quais alguns se converterão, outros  prenderão os pregadores e os oprimirão com maus tratos, durante a perseguição do Anticristo. 3°) Deus aparece, abre a boca do profeta que fala com mais força do que nunca; é o que acontecerá na vinda de Elias que, com suas pregações inflamadas e irresistíveis, converterá os restos de sua nação (In Ezeq. lib I, hom XIII).

Não nos cansamos de admirar a lucidez profética de São Gregório. Ele distingue de antemão as fases do grande acontecimento que nos ocupa: cisão do povo judeu em duas partes, opressão dos convertidos pelos refratários, conversão total operada por Elias.

O santo Papa assegura, em seus comentários sobre Jó, que esta volta definitiva dos restos de Israel será feita diante dos próprios olhos e a despeito da raiva do Anticristo (Mor. lib XXXV e XIV). Se a Igreja goza de semelhantes consolações debaixo do fogo da perseguição, qual não será esse gozo na hora do triunfo! É o que vamos considerar rapidamente.

III

Deus emprega anjos maus para destruições necessárias. O Anticristo, a seu modo e sem o querer, será a vara de Deus.

Esta vara de ferro pulverizará os cismas, as heresias, as falsas religiões, os restos do paganismo, o maometismo e o próprio judaísmo: ela esmagará o mundo em favor de uma prodigiosa unidade.

Quando esse colosso de impiedade for abatido pela pedrinha, esta se tornará uma montanha imensa e cobrirá a terra; o Evangelho, não tendo mais nenhuma sorte de obstáculo, reinará sem contradição sobre o universo inteiro.

Os judeus serão os primeiros operários desse estabelecimento do reino de Deus. São Paulo se extasia diante das grandes coisas que resultarão de sua conversão. “Se o pecado dos judeus foi a riqueza do mundo e a sua redução a riqueza das nações quanto mais sua adesão total?... se sua perda é a reconciliação  do mundo o que será a sua entrada na Igreja senão uma ressurreição?” (Rm 11, 12,  15). Tememos enfraquecer estas antíteses enérgicas, comentando-as.  É legítimo concluir que os judeus convertidos porão a serviço da Igreja um inestimável ardor de proselitismo. Rejuvenescida por essa infusão de vida, a Igreja sairá das garras da perseguição como de um túmulo, e tomará posse do mundo com a majestade de uma rainha e a ternura de uma mãe.

Serão esses acontecimentos o prelúdio imediato do último julgamento ou a aurora de uma nova era? Falaremos sobre as conjecturas que se pode formular sobre esta questão.


DÉCIMO ARTIGO

Janeiro 1886

A VINDA DO SOBERANO JUIZ

É supérfluo procurar precisar a hora em que terá lugar a segunda vinda de Nosso Senhor. É um impenetrável segredo para todas as criaturas. “Quanto àquele dia e àquela hora, nos diz Jesus Cristo, ninguém sabe, nem os anjos do céu, mas só o Pai” (Mt 24, 36).

No entanto, esse momento supremo, que porá fim a este mundo de pecado, será precedido de sinais estrondosos que fixarão a atenção não somente dos crentes mas também dos ímpios.

Primeiramente, como mostramos, haverá  a perseguição do Anticristo, a aparição de Henoc e de Elias. Quando São Paulo nos diz que Jesus Cristo matará o ímpio com o sopro de sua boca, e o destruirá com o brilho de sua vinda, parece que o castigo do Anticristo coincidirá com a vinda do soberano juiz. No entanto, não é esse o sentimento geral dos intérpretes. Pode-se explicar São Paulo dizendo que a destruição do ímpio só será consumada no dia do julgamento geral, se bem que sua morte tenha tido lugar tempos antes. De outro lado, os Evangelhos insinuam bem claramente que haverá um certo lapso de tempo, se bem que relativamente curto, entre a punição do monstro e a consumação de todas as coisas.

O que diz com efeito Nosso Senhor? Ele começa por pintar uma tal tribulação como nunca houve desde o começo do mundo: é a perseguição do Anticristo. Depois acrescenta: “Logo depois da tribulação daqueles dias, escurecer-se-á o sol, a lua não dará a sua luz, e as estrelas cairão do céu e as potestades do céu serão abaladas. E então aparecerá o sinal do Filho do homem no céu; e todas as tribos da terra chorarão e verão o Filho do Homem vir sobre as nuvens do céu com grande poder e majestade” (Mt 24, 29-30).

Estes sãos os sinais que precederão imediatamente a vinda de Jesus Cristo como Juiz.Mas como conciliar todos esses terríveis prelúdios com essa surpresa e imprevisão que segundo outros textos do Evangelho caracterizam esse acontecimento? Um pouco mais adiante, com efeito, Nosso Senhor nos apresenta os homens dos últimos dias do mundo semelhantes aos contemporâneos de Noé que o Dilúvio surpreende comendo e bebendo, casando-se e dando as filhas em casamento (Id., ibid., 36-40). Santo Tomás responde a essa objeção dizendo que todos os abalos precursores do fim do mundo podem ser considerados como fazendo corpo com o  próprio julgamento, parecendo esses estalos sinistros que não se distinguem do desmoronamento que os segue. Antes de todos esses terríveis presságios, os homens poderão zombar das advertências da Igreja. Mas ouvindo o estalar da máquina do mundo, empalidecerão; e como diz São Lucas, secarão de medo, à espera do que sobrevirá ao universo (Lc 21, 26).

Santo Tomás difunde uma luz viva sobre os tempos que passarão entre a morte do Anticristo e a vinda de Jesus Cristo, quando diz: “Antes que comecem a aparecer os sinais do julgamento, os ímpios crerão estar em paz e segurança, a saber, depois da morte do Anticristo, porque não verão o mundo acabar, como antes estimavam. (Suppl. Q. LXXI, art. I, ad. 1). Com a ajuda desta palavra podemos formar conjecturas mais plausíveis sobre os últimos tempos do mundo; e nossos leitores não deixarão de se interessar recebendo essas conjecturas a título de simples probabilidade.

II

Dissemos e mantemos como incontestável que a morte do Anticristo será seguida de um triunfo sem igual da Santa Igreja de Jesus Cristo. As alegrias proféticas de Tobias recuperando a vista ao mesmo tempo que reencontra o filho, a embriagadora alegria dos judeus com a queda de Aman e de seus satélites, os transportes dos habitantes de Betúlia, libertados por Judith do círculo de ferro que os apertava; a purificação do templo pelos Macabeus vencedores do ímpio Antíoco; enfim e sobretudo o calmo e pacífico triunfo de Jó restabelecido por Deus em todos os seus bens, vendo acorrer a seus pés amigos e parentes arrependidos e reunindo todos em um banquete religioso: todas essas imagens exprimem insuficientemente o estado da Santa Igreja, abrindo seu coração e seus braços a seus inimigos como a seus filhos, aos judeus convertidos como aos heréticos reconciliados,aos descendentes de Cam como aos filhos de Sem e de Jafé, em uma palavra, realizando a unidade comprada pelo preço do sangue de um Deus, um só rebanho e um só pastor!

Certamente, e mesmo neste período de triunfo, haverá ainda maus e ímpios; mas é nos permitido pensar que eles se esconderão e que desaparecerão na intensidade da alegria pública.

Infelizmente esses belos dias não durarão mais do que o tempo de poder esquecer os solenes acontecimentos que os fizeram nascer. Pouco a pouco a tibieza sucederá ao fervor; e essa passagem insensível se fará tão mais depressa quanto menos inimigos a Igreja tiver então para combater.

O estimado autor, Padre Armijon, pinta assim o estado no qual o mundo então cairá:

“A queda do mundo, diz ele, terá lugar instantaneamente e de improviso: veniet dies Dominisicut fur (2 Ped 3, 10). — Acontecerá em uma época em que o gênero humano, mergulhado no mais profundo desleixo,estará a mil léguas de sonhar com o castigo e com a justiça. A misericórdia divina terá esgotado todos os meios de ação. O Anticristo terá aparecido. Os homens espalhados em todos os espaços terão sido chamados ao conhecimento da verdade. A Igreja Católica por uma última vez terá desabrochado na plenitude da sua vida e da sua fecundidade. Mas todos esses favores assinalados e superabundantes, todos esses prodígios serão novamente  apagados do coração e da memória dos homens. A humanidade, por um abuso criminoso das graças, voltará a seu vômito. Voltando todas as suas aspirações para a terra, dará as costas a Deus, a ponto de não ver mais o céu nem se lembrar de seus justos julgamentos (Dn 13, 9). Toda fé estará extinta nos corações.

Toda carne terá corrompido seu caminho. A Divina Providência julgará que já não há mais remédio.

Será, diz Jesus Cristo, como no tempo de Noé. Os homens viviam despreocupados, plantavam, construíam  casas suntuosas, escarneciam prazerosamente do simplório Noé que se dedicava à profissão de carpinteiro, trabalhando dia e noite para construir sua barca. Diziam: que louco, que visionário! Isto durou até o dia em que veio o dilúvio e submergiu toda a terra: venit diluvium et perdiditomnes (Lc 17, 27).

Assim a catástrofe final se produzirá quando o mundo estiver mais em segurança; a civilização estará em seu apogeu, o dinheiro  abundará nos mercados e nunca os fundos públicos estarão tão altos. Haverá festas nacionais, grandes exposições; a  humanidade regurgitando de uma prosperidade material nunca vista, dirá como o avarento do Evangelho: Minha alma, tu tens bens por longos anos, beba, coma, divirta-se... Mas, de repente, no meio da noite, in media nocte — pois haverá trevas, e nessa hora fatídica da meia-noite, quando o Salvador apareceu pela primeira vez em sua baixeza, é que ele reaparecerá  em sua glória; — os homens, acordados em sobressalto, ouvirão um grande estrondo e um grande clamor, e uma voz se fará ouvir: Deus está aqui, saía seu encontro, exite obviamei (Mt 25, 6).

E o autor acrescenta que os homens não terão tempo para se arrependerem. Aqui nos separamos dele. A grande catástrofe será precedida de sinais apavorantes cujo conjunto formará um supremo apelo da misericórdia divina; bem cego e bem endurecido será quem resistir a tudo isso!

O sol se obscurecerá como que esgotado por um desperdício de luz. A lua não receberá mais nem um raio suficiente para brilhar. O céu se fechará como um livro invadido por uma obscuridade  espessa. As potências do céu serão abaladas; pois as leis dos movimentos dos corpos celestes  parecerão suspensas. Haverá uma profunda comoção no mar, um grande estrondo de ondas elevadas, a terra sacudida por movimentos insólitos; e os homens não saberão onde se lançarem para fugir dos elementos desencadeados. Enfim, a terra se abrirá e lançará globos de chamas que provocarão um abrasamento geral enquanto que aparecerá nos ares uma cruz faiscante anunciando a vinda do soberano Juiz.

Quanto tempo durarão esses sinais? Ninguém sabe. O que a Escritura nos diz é que os homens secarão de pavor. E acontecerá com eles o que aconteceu aos contemporâneos de Noé. Enquanto ele continuava a arca, escarneciam dele; mas quando o Dilúvio começou a invadir tudo, todos tremeram, e muitos, segundo o testemunho de São Pedro, se converteram. É-nos permitido esperar que também, à aproximação do julgamento, uma parte dos homens, vendo o céu se velar e sentindo a terra faltar sob os pés, façam um ato de contrição suprema e voltem ao estado de graça com Deus.

DÉCIMO PRIMEIRO ARTIGO

fevereiro de 1886

CONCLUSÃO

Chegamos ao termo do nosso estudo. Lançando um olhar sobre nossos destinos futuros, nos apoiamos unicamente nessas profecias que formam parte integrante da Escritura divina inspirada.

A substância de nosso trabalho é pois tirada das próprias fontes onde se alimenta a fé católica; e nós pensamos que não se possa negar sem temeridade, o que adiantamos no tocante ao acontecimento do Anticristo, o aparecimento de Henoc e Elias, a conversão dos judeus, os sinais precursores do julgamento.

Onde poderíamos nos enganar, seria nos comentários que fizemos de diversas passagens do Apocalipse, assim como no encaminhamento que procuramos estabelecer entre os acontecimentos citados mais acima. Mas se erramos foi seguindo intérpretes autorizados, no mais das vezes os padres da Igreja.

Estaremos errados em ver no presente estado do mundo os prelúdios da crise final que está descrita nos Livros Santos? Não cremos. A apostasia começada nas nações cristãs, o desaparecimento da fé em tantas almas batizadas, o plano satânico da guerra travada contra a Igreja, a chegada ao poder das seitas maçônicas são tais fenômenos que não poderíamos imaginar mais terríveis.

No entanto, não gostaríamos de forçar nosso pensamento. A época em que vivemos é indecisa e atormentada. A humanidade está inquieta  e hesitante. Ao lado  do mal há o bem; ao lado da propaganda revolucionária e satânica há um  movimento de renascimento católico, manifestado em tantas obras generosas e santas empresas. As duas correntes se desenham cada dia mais claramente; qual das duas arrastará a humanidade? Só Deus sabe, Ele que separa a luz das trevas, e marca seus respectivos lugares (Jó 38, 19-20).

Aliás, é certo que a carreira terrestre da Igreja está longe de ser encerrada: talvez ela nunca tenha estado tão aberta. Nosso Senhor nos deu a conhecer que o fim dos tempos não chegará antes que o Evangelho tenha sido pregado em todo o universo, em testemunho a todas as nações (Mt 24, 14). Ora, pode-se dizer que o Evangelho foi pregado no coração da África, na China, no Tibet? Alguns raios de luz não fazem um dia: alguns faróis acesos ao longo das costas não afastam a noite das terras profundas que se estendem por trás delas.

Como a Igreja percorrerá essa etapa? Sob que auspícios levará às nações que o ignoram ou que o receberam insuficientemente, o testemunho prometido por Nosso Senhor? Será uma época de relativa paz? Será entre as angústias de uma perseguição religiosa? Pode-se formular hipóteses nos dois sentidos. A Igreja se desenvolve de uma maneira que desconcerta as previsões humanas;quem se lembra das maravilhosas conquistas feitas em terras de infiéis no momento mais agudo da crise do protestantismo?

Na realidade, a mais absoluta confiança nos magníficos desígnios futuros da Igreja não é incompatível com nossas reflexões e nossas conjecturas sobre a gravidade da situação presente.

Estimando que assistimos aos prelúdios da crise que trará a aparição do Anticristo no cenário do mundo, nos guardamos de querer precisar o tempo e o momento; o que veríamos como uma temeridade ridícula. Que se nos permita uma comparação que explicará nosso pensamento.

Acontece ao viajante descobrir, em certo ponto da estrada, uma vasta extensão de terra, limitada no horizonte por montanhas longínquas mas que não saberia avaliar a distância que o separa delas. Quando empreende

atravessar essa distância intermediária,encontra barrancos, colinas, riachos, e o fim parece se afastar à medida que ele se aproxima.

Assim são, para nós, os tempos presentes, em nossa humilde opinião. Podemos pressentir a crise final vendo se urdir e se desenvolver sob nossos olhos o plano satânico do qual ela será o coroamento. Mas do ponto em que estamos até a hora da crise quantas surpresas nos estão reservadas para o futuro! Quantas restaurações do bem,sempre possíveis! E também quanto progresso do mal! Quantas alternativas na luta! Quantas compensações ao lado das perdas! É nisto que é preciso reconhecer, com Nosso Senhor, que só ao Pai pertence dispor dos tempos e dos momentos. Non est vestrum nosse tempora vel momenta, quæ Pater possuitinsua potestate (At1,7).

Nesta incerteza, dominada pelo pensamento da Providência, o que fazer?

Vigiar e orar.

Vigiar e orar, porque os tempos estão incontestavelmente perigosos, instabut tempora periculosa (2 Tm, 3, 8); porquenesta época de escândalo é grande o perigo de perder a fé.

Vigiar e orar, para que a Igreja faça sua obra de luz, a despeito dos homens das trevas.

Vigiar e orar para não cair em tentação.

Vigiar e orar todo o tempo, para sermos achados dignos de fugir dessas coisas que sobrevirão no futuro e de nos mantermos em pé em presença do Filho do homem, Vigilat, omni tempore orantes ut digni habeamini fugere ist omnia quæ futura sunt et stare ante filium hominis(Lc 21, 24).

Tradução: Anna Luiza Fleichman

Publicado em PERMANÊNCIA n°s 198-199 e 206-207


(Livro O Drama do Fim dos Tempos – Pe. Emmanuel-André – Ed. Eletrônica Permanência)

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