ENCÍCLICA
SATIS COGNITUM
DO SUMO
PONTÍFICE
LEÃO XIII
Sobre a
Unidade da Igreja
INTRODUÇÃO
Que
todos voltem à unidade.
1. Sabeis bastante que uma parte considerável dos Nossos
pensamentos e preocupações é dirigida para este fito: esforçar-Nos para
reconduzir os transviados ao redil governado pelo Supremo Pastor das almas,
Jesus Cristo. Com a alma aplicada a este objetivo, pensamos que seria
grandemente útil a esse intento e a essa empresa de salvação traçar a imagem da
Igreja, desenhar-lhe, por assim dizer, os traços principais, e pôr em relevo,
como o traço mais digno de uma atenção capital, a unidade: caráter insigne de
verdade e do invencível poder, que o Autor divino da Igreja imprimiu para
sempre na sua obra. Considerada na sua forma e beleza nativa, deve a Igreja ter
uma ação poderosíssima sobre as almas: não é afastar-se da verdade o dizer que
este espetáculo pode dissipar a ignorância, retificar as ideias falsas e os
preconceitos, sobretudo naqueles cujo erro não vem da sua própria culpa. Pode
ele mesmo excitar nos homens o amor da Igreja, um amor semelhante àquela
caridade sob cujo impulso Jesus Cristo escolheu a Igreja para sua esposa,
resgatando-a com seu sangue divino. Porquanto “Jesus Cristo amou a Igreja e a
si mesmo se entregou por ela” (Ef 5, 25).
Se, para volverem a essa mãe
amantíssima, os que ainda não a conhecem bem ou que cometem o erro de deixá-la,
devem comprar essa volta, isso não será, sem dúvida, ao preço de seu sangue (e
no entanto foi a esse preço que Jesus Cristo a pagou); mas, se lhes deve isso
custar alguns esforços, algumas penas bem mais leves de suportar, pelo menos
eles verão claramente que essas condições onerosas não foram impostas aos
homens por uma vontade humana, mas pela ordem e pela vontade de Deus: e, por
consequência, com o auxílio da graça celeste, facilmente experimentarão por si
mesmos a verdade desta divina palavra: “Meu jugo é suave e o meu fardo leve”
(Mt 11, 30). É por isso que, pondo a Nossa principal esperança no “Pai das
luzes, de quem descende toda a graça excelente e todo dom perfeito” (Tgo 1,
17), n’Aquele que é só quem “dá o incremento” (1 Cor 3, 6), instantemente Lhe
pedimos dignar-se de pôr em Nós o poder de persuadir.
I. UNICIDADE
E UNIDADE DA IGREJA
Origem
da Igreja Divina.
2. Sem dúvida Deus pode operar por si mesmo e por sua simples
virtude tudo o que os seres criados efetuam; todavia, por um conselho
misericordiosíssimo da sua Providência, para ajudar os homens preferiu ele
servir-se dos próprios homens. É por intermédio e pelo ministério dos homens
que ele habitualmente dá a cada um, na ordem puramente natural, a perfeição que
lhe é devida: assim faz ele também na ordem sobrenatural para lhes conferir a
santidade e a salvação. Evidente é, porém, que qualquer comunicação entre os
homens só pode fazer-se por meio das coisas exteriores e sensíveis. Foi por
isso que o Filho de Deus tomou a natureza humana, Ele que, “estando na forma de
Deus… aniquilou-se a si próprio tomando a forma de escravo, tendo sido feito
semelhante aos homens” (Filip 2, 6-7); assim, enquanto vivia na terra,
conversando com os homens, revelou-lhes a sua doutrina e as suas leis. Mas,
como a sua missão divina devia ser duradoura e perpétua, agregou ele a si
discípulos aos quais deu parte do seu poder, e, tendo feito descer sobre eles
do alto do céu “o Espírito de verdade”, ordenou-lhes percorrerem a terra inteira
e pregarem fielmente a todas as nações o que ele mesmo havia ensinado e
prescrito, a fim de que, professando a sua doutrina e obedecendo às suas leis,
pudesse o gênero humano adquirir a santidade na terra e a eterna felicidade no
céu.
Sua
natureza interna e externa.
3. Tal é o plano segundo o qual a
Igreja foi constituída, tais são os princípios que lhe presidiram ao
nascimento. Se olharmos nela o fim último que ela demanda, e as causas
imediatas pelas quais ela produz a santidade nas almas, certamente a Igreja é
espiritual; mas, se considerarmos os membros de que ela se compõe e os próprios
meios pelos quais os dons espirituais chegam até nós, a Igreja é exterior e
necessariamente visível. Foi por sinais que feriam os olhos e os ouvidos que os
Apóstolos receberam a missão de ensinar; e essa missão eles não a cumpriram de
outro modo que por palavras e atos igualmente sensíveis. Assim a sua voz,
entrando pelo ouvido externo, gerava a fé nas almas: “A fé vem pela audição, e
a audição pela palavra de Cristo” (Rom 10, 17). E, sem dúvida, a própria fé,
isto é, o assentimento à primeira e suma
verdade, por sua natureza está encerrado no
espírito,
mas deve entretanto patentear-se
fora pela evidente profissão que dela se faz: “Porque se crê de coração para a
justiça, mas se confessa de boca para a salvação” (Rom 10, 10). Assim também, nada é mais íntimo ao homem do
que a graça celeste, que produz nele a santidade; porém exteriores são os
instrumentos ordinários e principais pelos quais a graça nos é comunicada:
queremos falar dos sacramentos, que são administrados com ritos especiais, por
homens nomeadamente escolhidos para essa função. Jesus Cristo ordenou aos
Apóstolos instruírem e governarem os povos: ordenou aos povos receberem deles a
doutrina e se lhes submeterem docilmente à autoridade. Mas essas relações
mútuas de direitos e deveres na sociedade cristã, não somente não teriam podido
durar, mas não teriam mesmo podido estabelecer-se sem a mediação dos sentidos,
intérpretes e mensageiros das coisas. Por todas essas razões é que a Igreja,
nas santas Letras, tantas vezes é chamada um corpo, e também o corpo de Cristo
(1 Cor 12, 27): “Sois o corpo de Cristo.” Por ser um corpo, a Igreja é visível
aos olhos; por ser o corpo de Cristo, é um corpo vivo, ativo, cheio de seiva,
sustentado que é e animado por Jesus Cristo, que o penetra da sua virtude mais
ou menos como o tronco da vinha alimenta e fertiliza os ramos que lhe estão
unidos. Nos seres animados, o princípio vital é invisível e oculto no mais
profundo do ser, mas se acusa e se manifesta pelo movimento e pela ação dos
membros: assim o princípio de vida sobrenatural que anima a Igreja aparece a
todos os olhos pelos atos que ela produz.
Vinculação das duas partes pela vontade de Cristo.
4. Segue-se daí estarem em grande e pernicioso erro aqueles
que, plasmando a Igreja ao sabor da sua fantasia, a imaginam como oculta e de
modo algum visível; e aqueles também que a encaram como uma instituição humana,
munida de organização, de uma disciplina, de ritos exteriores, mas sem nenhuma
comunicação permanente dos dons da graça divina, sem nada que, por uma
manifestação cotidiana e evidente, ateste a vida sobrenatural haurida em Deus.
Ambas essas concepções são tão incompatíveis com a Igreja de Jesus Cristo,
quanto só o corpo ou só a alma é incapaz de constituir o homem. O conjunto e a
união desses dois elementos é absolutamente necessário à verdadeira Igreja,
mais ou menos como a íntima união da alma com o corpo é indispensável à
natureza humana. A Igreja não é uma espécie de cadáver: é o corpo de Cristo,
animado da sua vida sobrenatural. O próprio Cristo, chefe e modelo da Igreja,
não é integral se olharmos nele, ou exclusivamente a natureza humana e visível,
como fazem os partidários de Fotino e Nestório, ou unicamente a natureza divina
e invisível, como fazem os Monofisitas; mas Cristo é uno pela união das duas
naturezas, visível e invisível, e é uno em ambas; do mesmo modo, o seu corpo
místico só é a sua verdadeira Igreja com a condição de suas partes visíveis tirarem
a sua força e a sua vida dos dons sobrenaturais e dos próprios elementos
invisíveis; e desta união é que resulta a natureza própria das partes
exteriores.
5. Mas como a Igreja é tal pela vontade e por ordem de Deus,
tal deve permanecer, sem nenhuma interrupção, até o fim dos tempos, sem o que
evidentemente não teria sido fundada para sempre, e o próprio fim a que ela
tende seria limitado a um certo termo no tempo e no espaço: dupla conclusão
contrária à verdade. É, pois, certo que essa união de elementos visíveis e
invisíveis, estando pela vontade de Deus na natureza e constituição íntima da
Igreja, deve necessariamente durar tanto quanto durar a própria Igreja. É por
isso que S. João Crisóstomo nos diz: “Não te separes da Igreja; nada é mais
forte do que a Igreja. A tua esperança é
a Igreja; a tua salvação é a Igreja; o teu refúgio é a Igreja. Ela é mais alta
do que o céu e mais larga do que a terra. Ela nunca envelhece, eterno é o seu
vigor. Por isso a Escritura, para nos mostrar a inabalável solidez dela, a
chama uma montanha” (Hom. de capto Eutropio, n.º 6). Santo Agostinho
acrescenta: “Os infiéis creem que a religião cristã deve durar um certo tempo
no mundo, e depois desaparecer. Ela durará tanto quanto o sol: enquanto o sol
continuar a nascer e a se pôr, isto é, enquanto durar o próprio curso dos
tempos, a Igreja de Deus, isto é, o corpo de Cristo não desaparecerá do
mundo” (In Psalm.
LXXI). E o
mesmo Padre diz
alhures: “A Igreja
vacilará se o seu fundamento vacilar; como, porém, poderia
Cristo vacilar? Enquanto Cristo não vacilar, a Igreja jamais vergará até o fim
dos tempos. Onde estão os que dizem: ‘A Igreja desapareceu do mundo’, se nem
sequer pode ela vergar?” (Enarratio in Psalm. CIII, sermo II, n.º 5). Tais são
os fundamentos em que deve apoiar-se aquele que procura a verdade. A Igreja foi
fundada e constituída por Jesus Cristo Nosso Senhor; por conseguinte, quando
inquirirmos da natureza da Igreja, o
essencial é sabermos o que foi que Jesus Cristo quis fazer, e que fez na realidade.
É segundo esta regra que se deve tratar, sobretudo, da unidade da Igreja, sobre
a qual nos pareceu bom, no interesse comum, dizer alguma coisa nestas Letras.
II. A IGREJA DE CRISTO É ÚNICA
O
fato.
6. Sim, certamente a verdadeira
Igreja de Jesus Cristo é una: tão bem estabeleceram este ponto em todas as
mentes os testemunhos evidentes e multiplicados das santas Letras, que nem um
só cristão ousaria contradizê-lo. Mas, quando se trata de determinar e de
estabelecer a natureza desta unidade, vários se deixam transviar por diversos
erros. Não somente a origem da Igreja, porém todos os traços da sua
constituição pertencem à ordem das coisas que procedem de uma vontade livre;
toda a questão consiste, pois, em saber o que foi que, na realidade, teve
lugar, e cumpre investigar não de que modo a Igreja poderia ser una, porém que
unidade lhe quis dar o seu Fundador.
O
modo de unidade conhecido pela vontade de
Cristo.
7. Ora, se examinarmos os fatos,
verificaremos que Jesus Cristo não concebeu nem instituiu uma Igreja de várias
comunidades que se assemelhassem por certos traços gerais, mas fossem distintas
umas das outras, e não ligadas entre si por esses laços que são os únicos
capazes de dar à Igreja a individualidade e a unidade de que fazemos profissão
no símbolo da fé: “Creio na Igreja una”.
“A Igreja é constituída na unidade por sua própria natureza: é una, embora as
heresias tentem dilacerá-la em várias seitas. Dizemos que a antiga e católica
Igreja é una: tem ela unidade de natureza, de sentimento, de princípio, de
excelência… Aliás, o ápice da perfeição
da Igreja, como o fundamento da sua construção, consiste na unidade: é por aí
que ela excede tudo no mundo, é por aí que ela não tem nada igual nem semelhante
a si” (Clemens Alexandrinus, Stromatum, lib. VII, cap. 17). Mesmo porque,
quando Jesus Cristo fala desse edifício místico, menciona apenas uma única
Igreja, a que ele chama sua: “Edificarei a minha Igreja”. Não sendo fundada por
Jesus Cristo, qualquer outra que quiserem imaginar fora dessa não pode ser a
verdadeira Igreja de Jesus Cristo.
Pela qual fundou
uma única Igreja, para levar a salvação a todos os homens.
8. Ainda mais evidente é isto se
considerarmos o desígnio do Divino Autor da Igreja. Que foi que procurou, que
foi que quis Jesus Cristo Nosso Senhor no estabelecimento e manutenção de sua
Igreja? Uma só coisa: transmitir à Igreja a continuação da mesma missão, do
mesmo mandato que ele próprio recebera de seu Pai. Foi isso o que ele decretou
fazer, e foi o que realmente fez. “Assim como meu Pai me enviou, assim eu vos
envio (Jo 20, 21). Assim como vós me enviastes ao mundo, eu também os enviei
pelo mundo” (Jo 17, 18). Ora, está na missão de Cristo redimir da morte e
salvar “o que perecera”, isto é, não somente algumas nações ou algumas cidades,
senão a universalidade do gênero humano todo, sem distinção alguma nem no
espaço nem no tempo. “O Filho do Homem veio… para que o mundo seja salvo por
ele (Jo 3, 17). Porque nenhum outro nome sob o céu foi dado aos homens pelo
qual devamos ser salvos.” (At 4, 12). A missão da Igreja é, pois, espalhar ao
longe entre os homens e estender a todas as idades a salvação operada por Jesus
Cristo, e todos os benefícios que dela decorrem. É por isso que, consoante a
vontade de seu Fundador, necessário se torna que ela seja única em toda a
extensão do mundo, em toda a duração dos
tempos. Para que ela pudesse ter uma unidade maior, mister se faria sair dos
limites da terra e imaginar um gênero humano novo e desconhecido.
Por
isso a Igreja foi profetizada como único monte do Senhor.
9. Essa Igreja única, que devia
abranger todos os homens em todos os tempos e em todos os lugares, Isaías
divisara-a e designara-a antecipadamente, quando o seu olhar, penetrando o porvir,
tivera a visão de uma montanha cujo cimo elevado acima de todos os outros era
visível a todos os olhos, e que era a imagem da casa do Senhor, isto é, da
Igreja. “Nos últimos tempos, a montanha que é a casa do Senhor será preparada
no cume das montanhas” (Is 2, 2). Ora, essa montanha colocada no cume das
montanhas é única: única é essa casa do
Senhor, para a qual todas as nações devem um dia afluir a fim de aí acharem a
regra da sua vida. “E todas as nações afluirão para ela… e dirão: Vinde,
galguemos a montanha do Senhor, vamos à casa do Deus de Jacob, e ele nos
ensinará seus caminhos, e nós trilharemos as suas sendas” (Is 2, 2-3). Optato
de Milevo diz a propósito dessa passagem: “Está escrito no profeta Isaías: ‘A
lei sairá de Sião e a palavra do Senhor de Jerusalém’. Não é, pois, da montanha
material de Sião que Isaías avista o vale, mas sim da montanha santa que é a
Igreja, e que, enchendo o mundo romano todo, eleva seu cimo até o céu… A verdadeira Sião espiritual é, pois,
a Igreja, na qual Jesus Cristo foi estabelecido rei por Deus Padre, e que está
no mundo inteiro, o que só é verdade da Igreja Católica” (De schism. Donatist.,
lib. III, n. 2). E eis o que diz Santo Agostinho: “Que há de mais visível do
que uma montanha? E, no entanto, há montanhas desconhecidas, as que estão
situadas num canto afastado do globo…
Mas assim não é dessa montanha, visto que ela enche toda a superfície da terra,
e dela está escrito que foi preparada sobre o cume das montanhas” (In Epist.
Joan., tract. I, n. 13).
Profetizada
como único corpo de Cristo.
10. Cumpre acrescentar que o
Filho de Deus decretou que a Igreja seria o seu próprio corpo místico, ao qual
ele se uniria para lhe ser a cabeça, do mesmo modo que no corpo humano, que ele
tomou pela Encarnação, a cabeça se liga aos membros por uma união necessária e
natural. Assim como, pois, ele mesmo tomou um corpo mortal único, que votou aos
tormentos e à morte para pagar o resgate dos homens, assim também tem ele um
corpo místico único, no qual e por meio do qual faz os homens participarem da
santidade e da salvação eterna. “Deus estabeleceu-o (Cristo) chefe sobre toda a
Igreja que é o seu corpo” (Ef 1, 22-23).
Membros separados e dispersos não
podem reunir-se a uma só e mesma cabeça para formarem um só corpo. Ora, S.
Paulo nos diz: “Todos os membros do corpo, embora numerosos, não são,
entretanto, senão um só corpo: assim é Cristo” (1 Cor 12, 12). E é por isso,
diz-nos ele ainda, que esse corpo místico é unido e ligado. “Cristo é a cabeça,
em virtude da qual todo o corpo unido e ligado por todas as juntas, que se
prestam mútuo socorro, consoante uma operação proporcionada a cada membro (Ef
4, 15-16), recebe o seu crescimento para ser edificado na caridade”. Assim,
pois, se alguns membros ficam separados e afastados dos outros membros, não
podem pertencer à mesma cabeça a que pertence o resto do corpo. S. Cipriano
diz: “Há um só Deus, um só Cristo, uma só Igreja de Cristo, uma só fé, um só
povo, que pelo vínculo da concórdia é estabelecido na unidade sólida de um mesmo
corpo. A unidade não pode ser cindida: um corpo que permanece único não pode
dividir-se pelo fracionamento do seu organismo” (S. Cyprianus, De cath. Eccl.
unitate, n.º 23). Para mostrar melhor a unidade da sua Igreja, Deus no-la
apresenta sob a imagem de um corpo animado, cujos membros não podem viver senão
com a condição de estarem unidos com a cabeça e de tirarem incessantemente da
própria cabeça a sua força vital: separados, têm de morrer. “Ela não pode (a
Igreja) ser dispersada em pedaços pela dilaceração de seus membros e de suas
entranhas. Tudo o que for separado do centro da vida não mais poderá viver à
parte nem respirar” (In loc. cit.). Ora, em que é que um cadáver se parece com
um ser vivo? “Ninguém odiou jamais a sua carne, mas nutre-a e cuida dela, como Cristo cuida da Igreja,
porque nós somos os membros de seu corpo formados da sua carne e dos seus
ossos” (Ef 5, 29-30).
Busque-se, pois, outra cabeça
semelhante a Cristo, busque-se outro Cristo, se se quiser imaginar outra Igreja
fora daquela que lhe é o corpo. “Vede em que é que deveis tomar cuidado, vede
por que é que deveis velar, vede o que é que deveis temer. Às vezes, corta-se
um membro do corpo humano, ou, antes, separa-se esse membro do corpo: uma mão,
um dedo, um pé. Acaso a alma segue o membro cortado? Quando ele estava no
corpo, vivia; cortado, perde a vida. Assim o homem, enquanto vive no corpo da
Igreja, é cristão católico; separado dele, torna-se herege. A alma não
segue o membro
amputado” (S. Augustinus, Sermo CCLXVII, n. 4).
A Igreja de Cristo é, pois, a
única e, ademais, perpétua: quem quer que se separe dela, afasta-se da vontade
e da ordem de Jesus Cristo Nosso Senhor, deixa o caminho da salvação, vai à sua perda. “Quem quer que se
separe da Igreja para se unir a uma esposa adúltera, abdica também as promessas
feitas à Igreja. Quem quer que abandone a Igreja de Cristo não chegará às
recompensas de Cristo… Quem quer que não guarde essa unidade, não guarda a lei de Deus, não guarda a fé do
Pai e do Filho, não guarda a vida nem a salvação” (S. Cypr., De cath. Eccl.
unitate, n.º 6).
III. A IGREJA É UNA
O
fato consta das palavras de Cristo.
11. Mas Aquele que instituiu a Igreja única, instituiu-a também
una: quer dizer, de tal natureza que todos aqueles que deviam ser seus membros
fossem unidos pelos laços de uma
sociedade estreitíssima, de maneira a não formarem todos juntos senão um só povo, um só reino, um só corpo. “Sede um só corpo e
um só espírito, como fostes chamados a
uma só esperança na vossa vocação” (Ef 4, 4). Ao aproximar-se a sua
morte, Jesus Cristo sancionou e consagrou de maneira a mais augusta a sua
vontade sobre esse ponto, nesta prece que ele fez a seu Pai: “Não rogo só por
eles, mas ainda pelos que, pela palavra deles, crerem em mim… a fim de que
também esses sejam uma só coisa em nós… a fim de que sejam consumados na
unidade” (Jo 17, 20. 21. 23). Quis ele mesmo que o vínculo da unidade entre
seus discípulos fosse tão íntimo, tão perfeito, que imitasse de algum modo a
sua própria união com seu Pai: “Rogo-vos… que eles sejam todos uma mesma coisa,
como vós, meu Pai, estais em mim e eu estou em vós” (Jo 17, 21).
Ora, tamanha concórdia, tão
absoluta concórdia entre os homens deve ter por fundamento necessário o
entendimento e a união das inteligências; donde se seguirá naturalmente a
harmonia nas vontades e o acordo nas ações. Eis aí por que, segundo o seu plano
divino, Jesus quis que a unidade de fé existisse na sua Igreja: porque a fé é o
primeiro de todos os laços que unem o homem a Deus, e a ela é que devemos o
nome de fiéis. “Um só Senhor, uma só fé, um só batismo” (Ef 4, 5); quer dizer,
do mesmo modo que eles só têm um único Senhor e um único batismo, assim também
todos os cristãos, no mundo inteiro, não devem ter senão uma só fé.
E
do consentimento dos cristãos.
12. É por isso que o apóstolo S.
Paulo não roga somente aos cristãos terem todos os mesmos sentimentos e fugirem
ao desacordo das opiniões, mas conjura-os a isso pelos motivos mais sagrados:
“Conjuro-vos, irmãos, pelo nome de Nosso Senhor Jesus Cristo, a não terdes
todos senão uma mesma linguagem e a não sofrerdes cismas entre vós; mas a
serdes todos perfeitamente unidos no mesmo espírito e nos mesmos sentimentos”
(1 Cor 1, 10). Estas palavras, certamente, não necessitam de explicação: são
assaz eloquentes por si mesmas. Aliás, os que fazem profissão de cristianismo
reconhecem, de ordinário, que a fé deve ser una. O ponto mais importante e
absolutamente indispensável, aquele em que muitos caem em erro, é discernir de
que natureza, de que espécie é essa unidade. Ora, aqui, como o fizemos mais
acima em questão semelhante, não se deve julgar por opinião ou por conjectura,
mas consoante a ciência dos fatos: cumpre pesquisar e verificar qual a unidade
de fé que Jesus Cristo impôs à sua Igreja.
1) Unidade de Doutrina e magistério
Sobre
a forma da unidade deve ser interrogada a
mente de Cristo.
13. A doutrina celeste de Jesus
Cristo, embora esteja em grande parte consignada nos livros inspirados por
Deus, se tivesse sido entregue aos pensamentos dos homens não podia por si
mesma unir os espíritos. Com efeito, facilmente devia suceder incidir ela sob a
ação de interpretações variadas e divergentes entre si, e isso não somente por
causa da profundeza e mistérios dessa
doutrina, como também por causa da diversidade das mentes dos homens e da
perturbação que devia nascer do jogo e da luta das paixões contrárias. Da
diferença de interpretação nasce necessariamente a diversidade dos sentimentos:
daí controvérsias, dissensões, rixas, tais como as temos visto irromperem na
Igreja desde a época mais próxima da sua origem. Eis aqui o que escreve Santo
Irineu em falando dos hereges: “Eles confessam as Escrituras, mas lhes
pervertem a interpretação” (Lib. III, cap. 12, n. 12). E S. Agostinho: “A
origem das heresias e desses dogmas perversos que apanham as almas na armadilha
e as precipitam no abismo, é unicamente a de serem as Escrituras, que são boas,
compreendidas de maneira que não é boa” (In Evang. Joan., tract. XXVIII, cap.
5, n. 1). Para unir os espíritos, para
criar e conservar o acordo dos sentimentos, importava, pois, necessariamente,
apesar da existência das Escrituras divinas, um outro princípio. Exige-o a
sabedoria divina; porque Deus não pode ter querido a unidade da fé sem ter
provido de maneira conveniente à conservação dessa unidade, e as próprias
santas Letras indicam claramente que ele o fez, como diremos dentro em pouco.
Decerto, o infinito poder de Deus não está ligado nem adstrito a meio algum, e
toda criatura lhe obedece como instrumento dócil. Mister se faz, pois,
investigar, entre todos os meios que estavam no poder de Jesus Cristo, qual foi
esse principio exterior de unidade na fé que ele quis estabelecer. Para isso,
cumpre remontar pelo pensamento às primeiras origens do cristianismo.
Cristo
é Legado Divino.
14. Os fatos que vamos lembrar
são atestados pelas santas Letras e conhecidos de todos. Pela virtude dos seus
milagres, Jesus Cristo prova a sua divindade e a sua missão divina; emprega-se
em falar ao povo para instruí-lo nas coisas do céu, e exige absolutamente
que se preste fé inteira ao seu ensino;
exige-o sob a sanção de recompensas ou de penas eternas. “Se eu não faço as
obras de meu Pai, não me creiais (Jo 10, 37). Se eu não tivesse feito entre
eles obras que nenhum outro fez, eles não teriam pecado (Jo 15, 24). Mas, se eu
faço tais obras e se não quereis crer em mim mesmo, crede ao menos nas minhas
obras” (Jo 10, 38). Tudo o que ele ordena, ordena-o com a mesma autoridade; no
assentimento de espírito que exige, ele não excetua nada, não distingue nada.
Portanto, os que escutavam Jesus, se queriam chegar à salvação, tinham o dever
não somente de aceitar em geral toda a
sua doutrina, mas de dar pleno assentimento da alma a cada uma das coisas que
ele ensinava. Com efeito, recusar crer, ainda que fosse num único ponto, em
Deus que fala, é contrário à razão.
Como
tal entregou o seu múnus doutrinal aos Apóstolos.
15. Na iminência de voltar ao
céu, envia ele seus apóstolos, revestindo-se do mesmo poder com que seu Pai a
ele mesmo enviou, e ordena-lhes espalharem e semearem por toda parte sua
doutrina. “Todo poder me foi dado no céu e na terra. Ide, pois, e ensinai todas
as nações… ensinando-as a observar tudo o que eu vos ordenei” (Mt 28, 18-20).
Serão salvos todos os que obedecerem aos Apóstolos; os que não obedecerem,
perecerão. “Quem crer e for batizado, será salvo; quem não crer será condenado”
(Mc 16, 16). E, como convém sumamente à Providência divina não encarregar
alguém de uma missão, mormente se ela é importante e de alto valor, sem lhe dar
ao mesmo tempo os meios de desobrigar-se dela como é mister, Jesus Cristo
promete enviar aos seus discípulos o Espírito de verdade, que ficará neles
eternamente. “Se eu for, vo-lo enviarei (o Paráclito)… e, quando esse Espírito
de verdade vier, ensinar-vos-á toda a verdade (Jo 16, 7-13). E eu rogarei a meu
Pai, e ele vos dará outro Paráclito, para que ele fique sempre convosco: será o
Espírito de verdade… (Jo 14, 16-17). Ele é que dará testemunho de mim; e vós
também dareis testemunho” (Jo 15, 26-27).
Por consequência, ele ordena
aceitar religiosamente e observar santamente a doutrina dos Apóstolos como a
sua própria. “Quem vos escuta a mim escuta: quem vos despreza a mim despreza”
(Lc 10, 16). Os Apóstolos são, pois, enviados por Jesus Cristo do mesmo
modo que Ele próprio é enviado por seu
Pai: “Assim como meu Pai me enviou, assim eu vos envio” (Jo 20, 21). Por
conseguinte, assim como os Apóstolos e os discípulos eram obrigados a
submeter-se à palavra de Cristo, semelhantemente a mesma fé devia ser concedida
à palavra dos Apóstolos por todos
aqueles que os Apóstolos instruíam em virtude do seu mandato divino. Mais
lícito não era, pois, repudiar um só preceito da doutrina dos Apóstolos, do que
rejeitar o que quer que fosse da doutrina do próprio Jesus Cristo.
Certamente, a palavra dos
Apóstolos, após a descida do Espírito Santo neles, repercutiu até nos lugares
mais afastados. Em toda parte onde eles põem o pé, apresentam-se como os
enviados do próprio Jesus. “Por ele (Jesus Cristo) foi que recebemos a graça e
o apostolado para fazer obedecer à fé todas as nações em nome dele” (Rom 1, 5).
E em toda parte, sobre os passos deles, Deus faz brilhar a divindade de sua
missão por prodígios. “E, tendo partido, eles pregaram por toda parte,
cooperando o Senhor com eles e confirmando-lhes a palavra pelos milagres que a
acompanhavam” (Mc 16, 20). De que palavra se trata? Evidentemente daquela que
abrange tudo o que eles mesmos haviam aprendido de seu Mestre: porque eles
atestam publicamente e em plena luz ser-lhes impossível calar o que quer que
seja de tudo o que viram e ouviram.
Cujos
sucessores são os Bispos.
16. Mas, como dissemos noutro
lugar, a missão dos Apóstolos não era de natureza a poder perecer com a própria
pessoa dos Apóstolos, ou desaparecer do gênero humano. Jesus Cristo, com
efeito, ordenou aos Apóstolos pregarem “o Evangelho a toda criatura”, e “levarem
seu nome perante os povos e os reis”, e “lhe servirem de testemunhas até os
confins da terra”. E, no cumprimento dessa grande missão, prometeu estar com
eles, e isso não por alguns anos ou alguns períodos de anos, mas por todos os
tempos, “até à consumação dos séculos”. Sobre o que S. Jerônimo escreve:
“Aquele que promete estar com seus discípulos até à consumação dos séculos
mostra com isso que seus discípulos viverão sempre, e que ele mesmo jamais
cessará de estar com os crentes” (In Matth., lib. IV, cap. 28, v. 20). Como
poderia tudo isso ter-se realizado só nos Apóstolos, dada a sua condição de
homens sujeitos à lei suprema da morte? A Providência divina determinara, pois,
que o magistério instituído por Jesus Cristo não ficasse restrito aos limites
da própria vida dos Apóstolos, mas que durasse sempre. De fato, vemos que ele
se transmitiu, e que passou como de mão em mão no correr dos tempos. Os
Apóstolos, realmente, consagraram bispos e designaram nominativamente os que
deviam ser seus sucessores imediatos no “ministério da palavra”.
17. Mas não é tudo: ordenaram
ainda aos seus sucessores escolherem por si mesmos homens próprios para essa
função, revestirem-nos da mesma autoridade, e lhes confiarem, por sua vez, o
encargo e a missão de ensinar. “Tu, pois, ó meu filho, fortifica-te na
graça que está em Jesus Cristo: e o que
de mim ouviste perante grande número de testemunhas, confia-o a homens fiéis,
que sejam eles próprios capazes de instruir nelas os outros” (2 Tim 2, 1-2).
Verdade é, pois, que assim como Jesus Cristo foi enviado por Deus e os
Apóstolos por Jesus Cristo, assim também os bispos e todos os que sucederam aos
Apóstolos foram enviados pelos Apóstolos. “Os Apóstolos nos pregaram o
Evangelho, enviados por Nosso Senhor Jesus Cristo, e Jesus Cristo foi enviado
por Deus. A missão de Cristo é, pois, de
Deus, a dos Apóstolos é de Cristo, e ambas foram instituídas segundo a
ordem pela vontade de Deus… Os Apóstolos pregavam, pois, o Evangelho através das
nações e das cidades; e, depois de haverem experimentado, segundo o espírito de
Deus, os que eram as primícias daquelas cristandades, estabeleceram bispos e
diáconos para governarem os que em
seguida cressem… Instituíram os que acabamos de dizer, e mais tarde
tomaram disposições para que, vindo esses a morrer, outros homens
experimentados lhes sucedessem no seu ministério” (S. Clemens Rom., Epíst. ad
Corinth., cap. 42-44).
Forçoso é, pois, que de maneira
permanente subsista, de uma parte a missão constante e imutável de ensinar tudo
o que o próprio Jesus Cristo ensinou, e de outra parte a obrigação constante e
imutável de aceitar e de professar toda a doutrina assim ensinada. É o que S.
Cipriano exprime excelentemente nestes termos: “Quando Nosso Senhor Jesus
Cristo, no seu Evangelho, declara que os que não estão com ele são seus
inimigos, não designa uma heresia em
particular, mas denuncia como seus adversários todos aqueles que não estão
inteiramente com ele e que, não recolhendo com ele, põem a dispersão no seu
rebanho: ‘Quem não é comigo, diz ele, é contra mim, e quem não recolhe comigo
dispersa’” (Epíst. LXIX, ad Magnum, n. 2).
A
Igreja rejeitou sempre todo erro.
18. Penetrada a fundo dos seus
princípios e cuidadosa do seu dever, nada tem tido a Igreja tanto a peito, nada
tem demandado com maior esforço do que conservar de maneira a mais perfeita a
integridade da fé. Foi por isso que ela considerou como rebeldes declarados, e
tem expulso para longe de si todos aqueles que não pensavam como ela, fosse
sobre que ponto fosse da sua doutrina. Os Arianos, os Montanistas, os
Novacianos, os Quartodecimanos, os Eutiquianos certamente não tinham abandonado
a doutrina católica inteira, mas apenas essa ou aquela parte: e no entanto quem
é que não sabe que eles foram declarados hereges e rejeitados do seio da
Igreja? E julgamento semelhante tem condenado todos os fautores de doutrinas
errôneas que têm aparecido depois, nas diferentes épocas da história. “Nada
poderia ser mais perigoso do que esses hereges que, conservando em tudo o mais
a integridade da doutrina, por uma só palavra, como que por uma gota de veneno,
corrompem a pureza e a simplicidade da fé que recebemos da tradição dominical,
e depois apostólica” (Auctor Tractatus de Fide Orthodoxa contra Arianos). Tal
foi sempre o costume da Igreja, apoiada pelo juízo unânime dos santos Padres,
os quais sempre consideraram como excluído da comunhão católica e fora da
Igreja quem quer que se separe o menos possível da doutrina ensinada pelo
magistério autêntico. Epifânio, Agostinho, Teodoreto mencionaram cada um grande
número de heresias do seu tempo. Santo Agostinho observa que outras espécies de
heresias podem desenvolver-se, e que, se alguém aderir a uma só delas, por isso mesmo se separa da unidade católica. Diz
ele: “Do fato de alguém não crer esses erros (a saber, as heresias que ele
acaba de enumerar), não se segue deva crer-se e dizer-se cristão católico.
Porque pode haver, podem surgir outras heresias que não estejam mencionadas
nesta obra, e todo aquele que abraçasse uma delas deixaria de ser cristão
católico” (De Haeresibus, n. 88).
À
imitação de S. Paulo e dos Padres da Igreja.
19. Esse meio instituído por Deus
para conservar a unidade de fé de que falamos é exposto com insistência por S.
Paulo na sua epístola aos Efésios (4, 3 ss); exorta-os ele primeiro a
conservarem com grande cuidado a harmonia dos corações: “Aplicai-vos a
conservar a unidade de espírito pelo vínculo da paz”; e como os corações não
podem ser plenamente unidos pela caridade se os espíritos não estão de acordo
na fé, ele quer que não haja em todos senão uma mesma fé. “Um só Senhor e uma
só fé”. E quer uma unidade tão perfeita, que exclua todo perigo de erro: “a fim
de que não mais sejamos como criancinhas que flutuam, nem levados para cá e
para lá por todo vento de doutrina, pela maldade dos homens, pela astúcia que
arrasta à armadilha do erro”. E ensina que essa regra deve ser observada não
por um tempo, mas “até que cheguemos todos à unidade da fé, à medida da idade
da plenitude de Cristo”. Onde, porém, colocou Jesus Cristo o princípio que deve
estabelecer essa unidade, e o socorro que a deve conservar? Ei-lo: “Estabeleceu
ele a uns Apóstolos… a outros pastores e doutores, para a perfeição dos santos,
para a obra do ministério, para a edificação do corpo de Cristo”.
Por isso tem sido essa mesma
regra que, desde a antiguidade mais remota, os Padres e os Doutores têm sempre
seguido e unanimemente defendido. Escutai Orígenes: “Todas
as vezes que os hereges nos mostram as Escrituras canônicas, às quais
todo cristão dá seu assentimento e fé, parecem dizer: ‘É conosco que está a
palavra de verdade’. Mas não os devemos crer, nem nos afastar da primitiva
tradição eclesiástica, nem crer outra coisa senão o que as Igrejas de Deus nos
hão ensinado pela tradição sucessiva” (Vetus interpretatio commentariorum in
Matth., n. 46).
Escutai Santo Irineu: “A
verdadeira sabedoria é a doutrina dos Apóstolos… que chegou até nós pela
sucessão dos bispos… transmitindo-nos o conhecimento mui completo das
Escrituras, conservadas sem alteração” (Contra Haereses, lib. IV, cap. 33, n.
8).
Eis aqui o que diz Tertuliano: “É
constante que toda doutrina conforme à das Igrejas apostólicas, mães e fontes
primitivas da fé, deve ser declarada verdadeira, visto sem nenhuma dúvida
guardar o que as Igrejas receberam dos Apóstolos, os Apóstolos de Cristo,
Cristo de Deus… Estamos em comunhão com as Igrejas apostólicas; ninguém tem
doutrina diferente: é este o testemunho da verdade” (De Praescrip., cap. XXI).
E Santo Hilário: “Ensinando da
barca, Cristo faz-nos entender que os que estão fora da Igreja não podem ter nenhuma inteligência da
palavra divina. Porquanto a barca representa
a Igreja, só na qual o Verbo de vida reside e se faz ouvir, e os que
estão fora e que aí ficam, estéreis e inúteis como a areia da praia, não podem
compreendê-lo” (Comment. in Matth., XIII, n. 1).
Rufino louva S. Gregório
Nazianzeno e S. Basílio por “se darem unicamente ao estudo dos livros da
Escritura sagrada, e por não terem a presunção de pedir a inteligência deles
aos seus próprios pensamentos, mas por procurarem-na nos escritos e na
autoridade dos antigos, que, por sua
vez, como era constante, tinham recebido da sucessão apostólica a regra da
interpretação” (Hist. Eccles., lib. II, cap. 9).
Todos
devem obediência ao magistério da Igreja.
20. Evidente é, pois, consoante
tudo o que acaba de ser dito, que Jesus Cristo instituiu na Igreja um
magistério vivo, autêntico e, ademais,perpétuo, o qual ele investiu da sua
própria autoridade, revestiu do espírito de verdade, confirmou por milagres, e quis
e severissimamente ordenou que os ensinamentos doutrinais desse magistério
fossem recebidos como os seus próprios.
Todas as vezes, pois, que a
palavra desse magistério declara que essa ou aquela verdade faz parte do
conjunto da doutrina divinamente revelada, deve cada um crer com certeza
que isso é verdade; porque, se de algum
modo isso pudesse ser falso, daí se seguiria, o que evidentemente é absurdo,
que o próprio Deus seria o autor do erro dos homens. “Senhor, se estamos no
erro, fostes vós mesmo que nos enganastes” (Richardus de S. Victore, De Trin.,
lib. I, cap. 2). Afastado assim todo motivo de dúvida, pode então ser lícito a
quem quer que seja repelir alguma dessas verdades, sem se precipitar
abertamente na heresia, sem se separar da Igreja, e sem repudiar em bloco toda
a doutrina cristã?
Porque a natureza da fé é tal,
que nada é mais impossível do que crer isto e rejeitar aquilo. Com efeito, a
Igreja professa que a fé é “uma virtude sobrenatural pela qual, sob a inspiração e com o socorro da graça de
Deus, nós cremos que aquilo que por ele nos foi revelado é verdadeiro; cremo-lo
não por causa da verdade intrínseca das coisas vista na luz natural da nossa
razão, mas por causa da autoridade do próprio Deus, que nos revela essas
verdades, e que não pode nem se enganar nem nos enganar” (Conc. Vat., sess.
III, cap. 3). Se há, pois, um ponto que evidentemente tenha sido revelado por
Deus e que nós recusamos crer, não
cremos absolutamente nada com fé divina. Porquanto o juízo que S. Tiago (2, 10)
emite a respeito das faltas na ordem moral, cumpre aplicá-lo aos erros de
pensamento na ordem da fé. “Quem quer que se torne culpado só num ponto,
torna-se transgressor de todos”. Isso é mesmo muito mais verdadeiro dos erros
do pensamento. Com efeito, não é no sentido mais próprio que se pode chamar
transgressor de toda a lei aquele que cometeu uma falta moral; porque, se ele
pode parecer ter desprezado a majestade de Deus, autor de toda a lei, esse
desprezo só aparece por uma espécie de interpretação da vontade do pecador. Ao
contrário, aquele que, mesmo num só ponto, recusa o seu assentimento às
verdades divinamente reveladas, realissimamente abdica por completo a fé, visto
recusar-se submeter-se a Deus enquanto suma verdade e motivo próprio da fé. “Em
muitos pontos eles estão comigo, em alguns apenas não estão comigo; mas, por
causa desses alguns pontos em que eles se separam de mim, de nada lhes serve
estar comigo em tudo o mais” (S. Augustinus, in Psalm. LIV, n. 19). Nada mais
justo: porque aqueles que só tomam da doutrina cristã o que querem, apoiam-se
no seu próprio juízo e não na fé; e, recusando “reduzir à servidão toda
inteligência sob a obediência de Cristo” (2 Cor 10, 5), na realidade obedecem a
si mesmos antes que a Deus. “Vós que no Evangelho credes o que vos apraz e
recusais crer o que vos desagrada, vós credes em vós mesmos muito mais do que
no Evangelho” (S. Augustinus, lib. XVII, Contra Faustum Manichaeum, cap. 3).
21. Os Padres do Concílio do
Vaticano nada, pois, decretaram de novo, mas apenas fizeram conformar-se com a
instituição divina, com a antiga e constante doutrina da Igreja e com a própria
natureza da fé, quando formularam este decreto: “Devem-se crer, de fé divina e
católica, todas as verdades que estão contidas na palavra de Deus escrita ou
transmitida pela tradição, e que a
Igreja, quer por um juízo solene, quer pelo seu magistério ordinário e
universal, propõe como divinamente revelada” (Sess. III, c. 3). Para concluir,
já que é evidente querer Deus absolutamente na sua Igreja a unidade de fé, já
que ficou demonstrado de que natureza quis ele fosse essa unidade e por que
princípio decretou assegurar-lhe a conservação, lícito nos seja dirigir-nos a
todos aqueles que não resolveram fechar os ouvidos à verdade e dizer-lhes com
Santo Agostinho: “Já que vemos nisso um tão grande socorro de Deus, tanto
proveito e utilidade, hesitaremos em lançar-nos no seio dessa Igreja, que, pela
confissão do gênero humano inteiro, deriva da sé apostólica e pela sucessão dos seus bispos tem conservado
a autoridade suprema, a despeito do clamor dos hereges que a assediam e que têm
sido condenados, ora pelo juízo do povo, ora pelas solenes decisões dos
Concílios, ora pela majestade dos milagres? Não querer dar-lhe o primeiro lugar
é certamente fruto ou de uma suma impiedade ou de uma arrogância desesperada.
E, se toda ciência, mesmo a mais humilde e a mais fácil, para ser adquirida
exige o socorro de um doutor ou de um mestre, pode-se, quando se trata dos
livros dos divinos mistérios, imaginar
orgulho mais temerário
do que recusar
receber-lhes o conhecimento da boca dos seus
intérpretes, e, sem os conhecer, querer condená-los?” (De utilitate credendi,
cap. XVII, n. 35).
2)
Unidade no múnus de santificação e direção
O
múnus da santificação é o mais nobre.
22. Sem dúvida alguma, pois, é
dever da Igreja conservar e propagar a doutrina cristã em toda a sua
integridade e pureza. Mas a isso não se limita o seu papel e o próprio fim para
o qual a Igreja foi instituída não se esgota por essa primeira obrigação. De
feito, foi pela salvação do gênero humano que Jesus Cristo se sacrificou, foi a
esse fim que ele referiu todos os seus ensinamentos e todos os seus preceitos;
e o que ele ordena à Igreja procurar na verdade da doutrina, é santificar e salvar
os homens. Mas esse desígnio tão grande, tão excelente, a fé por si só
absolutamente não pode realizá-lo; cumpre aditar-lhe o culto prestado a Deus,
em espírito de justiça e piedade, e que compreende sobretudo o sacrifício
divino e a participação nos sacramentos; depois, ainda, a santidade das leis
morais e da disciplina. Tudo isso deve, pois, encontrar-se na Igreja, visto
estar ela encarregada de continuar até o fim dos tempos as funções do Salvador:
a religião, que, pela vontade de Deus, de alguma sorte tomou corpo nela, só a
Igreja a oferece ao gênero humano em toda a sua plenitude e perfeição; e, do
mesmo modo, todos os meios de salvação que, no plano ordinário da Providência,
são necessários aos homens, só ela os proporciona a esses mesmos homens.
Entregue
aos Apóstolos.
23. Porém, assim como a doutrina
celeste nunca foi abandonada ao capricho ou ao juízo individual dos homens, mas
primeiro foi ensinada por Jesus, e depois conferida exclusivamente ao
magistério de que tratamos, assim também não ao que primeiro vem entre o povo
cristão, mas a certos homens escolhidos, é que foi dada por Deus a faculdade de
cumprir e administrar os divinos mistérios, e também o poder de mandar e de
governar. Realmente, só aos apóstolos e aos seus legítimos sucessores é que se
dirigem estas palavras de Jesus Cristo: “Ide pelo mundo inteiro, pregai nele o
Evangelho… batizai os homens… fazei isto em memória de mim… Os pecados serão
perdoados àqueles a quem os perdoardes”. Do mesmo modo, só aos apóstolos e aos
seus legítimos sucessores foi que ele ordenou apascentarem o rebanho, isto é,
governarem com autoridade todo o povo cristão, o qual, em consequência e por
esse mesmo fato, é obrigado a lhes ser submisso e obediente. Todo o conjunto
dessas funções do ministério apostólico está compreendido nestas palavras de S.
Paulo: “Que os homens nos olhem como ministros de Cristo e dispensadores dos
mistérios de Deus” (1 Cor 4, 1).
A
exercer-se na Igreja, como em sociedade religiosa.
24. Assim Jesus Cristo chamou
todos os homens sem exceção, os que existiam no seu tempo e os que deviam
existir no futuro, a segui-lo como chefe e como Salvador, não só cada um
separadamente, mas todos juntos, unidos por uma tal associação das pessoas e
dos corações, que dessa multidão resultasse um só povo legitimamente
constituído em sociedade: um povo verdadeiramente unido pela comunidade de fé,
de fim, de meios apropriados ao fim, um povo sujeito a um só e mesmo poder. Por
esse mesmo fato, todos os princípios naturais que entre os homens criam espontaneamente
a sociedade destinada a fazê-los alcançar a perfeição de que a sua natureza é
capaz, foram estabelecidos por Jesus Cristo na Igreja, de maneira que, no seio
dela, todos os que querem ser filhos adotivos de Deus possam alcançar e
conservar a perfeição conveniente à sua dignidade, e assim operar a sua
salvação. A Igreja, pois, como o indicamos alhures, deve servir aos homens de
guia para o céu, e Deus deu a ela a missão de julgar e decidir por si mesma de
tudo o que concerne à religião, e
administrar a seu talante, livremente e sem peias, os interesses cristãos. É,
pois, ou não conhecê-la bem ou caluniá-la injustamente o acusá-la de querer
invadir o domínio próprio da sociedade civil, ou usurpar os direitos dos
soberanos. Muito mais, Deus fez da Igreja a mais excelente, de muito, de todas
as sociedades; porquanto o fim que ela colima sobreleva em nobreza ao fim que
colimam as outras sociedades, tanto quanto a graça divina sobreleva à natureza,
e quanto os bens imortais são superiores às coisas perecíveis.
Daí
compete à Igreja o poder de reger.
25. Pela sua origem, a Igreja é,
portanto, uma sociedade divina; pelo seu fim e pelos meios imediatos que a ele
conduzem, é sobrenatural; pelos membros de que se compõe e que são homens, é
uma sociedade humana. É por isso que a vemos designada nas santas Letras por
nomes que convêm a uma sociedade perfeita. Ela é chamada não somente a Casa de
Deus, a Cidade colocada sobre a montanha
e onde todas as nações devem reunir-se, mas ainda o Aprisco, que um só pastor deve governar
e onde devem refugiar-se todas as ovelhas de Cristo; é chamada o Reino
suscitado por Deus e que durará eternamente; enfim, o Corpo de Cristo,
corpomístico, sem dúvida, mas vivo todavia, perfeitamente conformado e composto de grande número de membros, membros estes
que não têm todos a mesma função, mas estão ligados entre si e unidos sob o
império da cabeça que dirige tudo.
Ora, é impossível imaginar uma
sociedade humana verdadeira e perfeita que não seja governada por um poder
soberano qualquer. Jesus Cristo deve, pois, ter posto à testa da Igreja um
chefe supremo a quem toda a multidão dos cristãos fosse submissa e obediente.
Eis por que, assim como a Igreja, para ser una enquanto é a reunião dos fiéis,
requer necessariamente a unidade de fé, assim também, para ser una enquanto é
uma sociedade divinamente constituída, requer de direito divino a unidade de
governo, a qual produz e compreende a unidade de comunhão. “A unidade da Igreja
deve ser considerada sob dois aspectos: primeiro na conexão mútua dos membros
da Igreja ou na comunicação que eles têm entre si; e, segundo, na ordem que
liga todos os membros da Igreja a um só chefe” (S. Thomas, 2a 2ae, q. XXXIX, a.
1.).
Por onde se pode compreender que
os homens não se separam menos da unidade da Igreja pelo cisma do que pela
heresia. “Põe-se esta diferença entre a heresia e o cisma, que a heresia
professa um dogma corrompido; o cisma, em consequência de uma dissensão no episcopado,
separa-se da Igreja” (S. Hieronymus, Commentar. in Epist. ad Titum, cap. III, vv. 10-11). Estas palavras
concordam com as de S. João Crisóstomo sobre o mesmo assunto: “Digo e protesto que dividir a
Igreja não é um mal menor do que cair na heresia” (Hom. XI, in Epist. ad
Ephes., n. 5). E eis aí por que, se nenhuma heresia pode ser legítima, do mesmo
modo não há cisma que se possa considerar como feito com razão. “Não há nada
mais grave do que o sacrilégio do cisma: não há necessidade legítima de quebrar
a unidade” (S. Augustinus, Contra epistolam Parmeniani, lib. II, cap. 2, n.
25).
26. Qual é esse soberano poder ao
qual todos os cristãos devem obedecer? de que natureza é ele? Só se pode
determiná-lo verificando e conhecendo bem qual foi sobre este ponto a vontade
de Cristo. Certamente, Cristo é o rei eterno, e eternamente, do alto do
céu, continua a dirigir e a proteger
invisivelmente o seu reino; mas, já que ele quis que esse reino fosse visível, deve ter designado
alguém para ocupar o seu lugar na terra depois que ele tivesse subido ao céu.
“Se alguém diz que o único chefe e o único pastor é Jesus Cristo, que é o único
esposo da Igreja única, esta resposta não é suficiente. Evidente é, com efeito,
ser o próprio Jesus Cristo quem opera os sacramentos na Igreja; é ele quem
batiza, é ele quem perdoa os pecados; ele é o verdadeiro sacerdote que se
ofereceu sobre a ara da cruz; e, no entanto, como ele não devia ficar com todos
os fiéis por sua presença corporal, escolheu ministros por meio dos quais
pudesse dispensar aos fiéis os sacramentos de que acabamos de falar, como
dissemos mais acima (cap. 74). Assim também, por isso que ele devia subtrair à
Igreja a sua presença corporal, mister se fez designasse alguém para tomar
em seu lugar o cuidado da Igreja
universal. Foi por isso que ele disse a Pedro, antes da sua ascensão:
‘Apascenta minhas ovelhas’” (S. Thomas, Contra gentiles, lib. IV, cap. 76).
Jesus Cristo deu, pois, Pedro à Igreja por soberano chefe, e estabeleceu que
esse poder, instituído até o fim dos tempos para a salvação de todos, passaria
por herança aos sucessores de Pedro, nos quais o próprio Pedro sobreviveria a
si perpetuamente pela sua autoridade.
Confiado
a)
a Pedro como príncipe dos Apóstolos.
A
Pedro prometido por Cristo.
27. Certamente, foi ao bem-aventurado Pedro, e fora dele a nenhum
outro, que ele fez esta promessa insigne: “Tu és Pedro, e sobre esta pedra
edificarei a minha Igreja” (Mt 16, 18). “Foi a Pedro que o Senhor falou: a um
só, a fim de fundar a unidade por um só” (S. Pascianus ad Sempronium, epist.
III, n. 11). — “Efetivamente, sem nenhum preâmbulo, ele designa pelo seu nome
tanto o pai do apóstolo como o próprio apóstolo (Bem-Aventurado és tu, Simão,
filho de Jonas), e não mais permite que o chamem Simão, reivindicando-o
doravante como seu em virtude do seu poder; depois, por uma imagem muito
apropriada, quer que o chamem Pedro, porque ele é a pedra sobre a qual devia
ele fundar a sua Igreja” (S. Cyrillus Alexandrinus, in Evang. Joan., lib. II,
in cap. I, v. 42).
Segundo esse oráculo, é evidente
que, por vontade e ordem de Deus, a Igreja foi estabelecida sobre o
bem-aventurado Pedro, como o edifício sobre o seu alicerce. Ora, a natureza e a
virtude própria do alicerce é dar a coesão ao edifício pela conexão íntima das
suas diferentes partes; é ainda ser o liame necessário da segurança e solidez
da obra inteira: se o alicerce desaparece, todo o edifício desmorona. O papel
de Pedro é, pois, suportar a Igreja e manter nela a conexão, a solidez de uma
coesão indissolúvel. Ora, como poderia ele desempenhar semelhante papel se não
tivesse o poder de mandar, de proibir, de julgar, numa palavra, se não tivesse
um poder de jurisdição próprio e verdadeiro? É evidente que os Estados e as
sociedades só podem subsistir graças a um poder de jurisdição. Um primado de
honra, ou ainda o poder tão modesto de aconselhar e advertir, que é chamado
poder de direção, são incapazes de emprestar a qualquer sociedade humana um
elemento bem eficaz de unidade e solidez.
28. Ao contrário, esse verdadeiro
poder de que falamos é declarado e afirmado nestas palavras: “E as portas do
inferno não prevalecerão contra ela”. — “Que quer dizer contra ela? Será contra a pedra sobre a qual Cristo
edifica a Igreja? A frase fica ambígua; seria para significar que a pedra e a
Igreja não são senão uma só e a mesma coisa? Sim, é esta, creio eu, a verdade:
porque as portas do inferno não prevalecerão nem contra a pedra sobre a qual
Cristo edifica a sua Igreja, nem contra a própria Igreja”
(Orígenes, Comment. in Matth., t.
XII, n. 11). Eis aqui o alcance dessa divina palavra: Seja qual for a
violência, qualquer que seja a habilidade que desenvolvam os seus inimigos
visíveis e invisíveis, a Igreja, apoiada em Pedro, nunca poderá sucumbir nem
desfalecer no que quer que seja. “A Igreja, sendo, como é, o edifício de
Cristo, que sabiamente edificou ‘sua casa sobre a pedra’, não pode estar
sujeita às portas do inferno; estas podem prevalecer contra todo aquele que se
achar fora da pedra, fora da Igreja, mas são impotentes contra ela” (Orígenes,
Comment. in Matth., t. XII, n. 11). Se Deus confiou sua Igreja a Pedro, foi,
pois, a fim de que esse sustentáculo invencível a conservasse sempre em toda a
sua integridade. Ele a investiu, pois, da autoridade necessária; porquanto,
para sustentar real e eficazmente uma Sociedade humana, àquele que a sustenta é
indispensável o direito de mandar.
29. Jesus acrescentou ainda: “Eu te darei as chaves do reino dos
céus”. É claro que ele continua a falar da Igreja, dessa Igreja que ele acaba
de chamar sua, e que declarou querer edificar sobre Pedro como sobre o seu
fundamento. A Igreja oferece, com efeito, a imagem não só de um edifício, mas
de um reino; de resto, ninguém ignora que as chaves são a insígnia comum da
autoridade. Assim, quando Jesus promete dar a Pedro as chaves do reino dos
céus, promete dar-lhe o poder e a autoridade sobre a Igreja. “O Filho lhe deu
(a Pedro) a missão de difundir pelo mundo inteiro o conhecimento do Pai e do
próprio Filho, e deu a um homem mortal todo o poder celeste, quando confiou as
chaves a Pedro, que estendeu a Igreja até aos confins do mundo e que a mostrou
mais inabalável que o céu” (S. Joannes Chrysostomus, Hom. LIV, in Matth., n.
2).
O que se segue ainda tem o mesmo
sentido: “Tudo o que ligares na terra será ligado também no céu, e tudo o que
desligares na terra será desligado também no céu”. Essa expressão figurada:
ligar e desligar, designa o poder de estabelecer leis, e também o poder de
julgar e de punir. E Jesus Cristo afirma que esse poder terá tal extensão, tal
eficácia, que todos os decretos emitidos por Pedro serão ratificados por Deus.
Esse poder é, pois, soberano e
inteiramente independente, por não ter na terra nenhum poder acima dele, e por
abranger a Igreja toda e tudo o que à Igreja está confiado.
Conferida
ao mesmo Pedro.
30.A promessa feita a Pedro foi
cumprida no tempo em que Jesus Cristo Nosso Senhor, após a sua ressurreição,
tendo perguntado por três vezes a Pedro se o amava mais do que os outros, lhe
disse sob forma imperativa: “Apascenta os meus cordeiros… apascenta as minhas
ovelhas (Jo 21, 16-17). Quer dizer que todos aqueles que devem estar um dia no
seu aprisco, ele os entrega a Pedro como ao seu verdadeiro pastor. “Se o Senhor
interroga, não é que duvide: ele não quer instruir-se, mas, pelo contrário,
instruir aquele a quem, estando ele, o Senhor, na iminência de subir ao céu,
nos deixava como o vigário do seu amor… E por isso que, único entre todos,
Pedro professa esse amor, é posto à testa de todos os outros… à testa dos mais
perfeitos, para os governar, sendo mais perfeito ele
mesmo” (S. Ambrosius, Exposit. in Evang. secundum Lucam,
lib. X, n. 175-176). Ora, o dever e o papel do pastor é de guiar o rebanho, de
velar pela sua salvação proporcionando-lhes pastos salutares, afastando os
perigos, desmascarando as ciladas, repelindo os ataques violentos; em suma,
exercendo a autoridade de governo. Portanto, já que Pedro foi preposto como
pastor ao rebanho dos fiéis, recebeu o poder de governar todos os homens por
cuja salvação Jesus Cristo derramou o seu sangue. “Por que foi que ele derramou
seu sangue? Para redimir essas ovelhas que ele confiou a Pedro e aos seus
sucessores” (S. Joannes Chrysostomus, De sacerdotio, lib. II).
Ele
é o esteio da fé.
31. E, por ser necessário que
todos os cristãos estejam ligados entre si pela comunidade de uma fé imutável,
por isso foi que pela virtude de suas preces Jesus Cristo Nosso Senhor obteve
para Pedro que, no exercício de seu poder, a sua fé nunca desfalecesse. “Roguei
por ti, a fim de que tua fé nunca desfaleça” (Lc 22, 32). E ordenou-lhe, além
disso, todas as vezes que as circunstâncias o pedissem, comunicar ele próprio a
seus irmãos a luz e a energia da sua alma: “Confirma teus irmãos” (Lc 22, 32).
Aquele, pois, que ele designara como o fundamento da Igreja, ele quer que seja
a coluna da fé. “Já que por sua própria autoridade ele lhe dava o reino, não
podia consolidar-lhe a fé, tanto mais quanto, chamando- o Pedro, o designava
como o fundamento que devia consolidar a Igreja?” (S. Ambrosius, de Fide, lib.
IV, n. 56).
Vem daí que certos nomes que
designam grandíssimas coisas e “que pertencem como próprios a Jesus Cristo em
virtude do seu poder, o próprio Jesus quis torná-los comuns a si e a Pedro por
participação” (S. Leo M., sermo IV, cap. 2), a fim de que a comunidade dos
títulos manifestasse a comunidade do poder. Assim ele, que é “a pedra principal
do ângulo,
sobre a qual todo o edifício
construído se eleva como um templo sagrado do Senhor” (Ef 2, 21), estabeleceu
Pedro como a pedra sobre a qual devia ser apoiada a sua Igreja. “Quando Jesus
lhe disse: ‘Tu és pedra’, essa palavra conferiu-lhe um belo título de nobreza.
E no entanto ele é a pedra, não como Cristo é a pedra, mas como Pedro pode ser
a pedra. Porque Cristo é essencialmente a pedra inabalável, e por ela é que
Pedro é a pedra. Porque Jesus comunica suas dignidades sem se empobrecer… Ele é
o sacerdote, ele faz os sacerdotes… Ele é a pedra, ele faz de seu apóstolo a
pedra” (Hom. de Paenitentia, n. 4 in appendice opp. S. Basilii).
Ele é ainda o rei da Igreja, “que
possui a chave de David; ele fecha e ninguém pode abrir; ele abre e ninguém pode fechar” (Apoc 3, 7);
ora, dando as chaves a Pedro, ele o declara o chefe da sociedade cristã. Ele é ainda
o pastor supremo que a si mesmo se chama “o bom pastor”; ora, ele estabeleceu
Pedro como pastor de seus cordeiros e de suas ovelhas (Jo 10, 11). Foi por isso
que S. Crisóstomo disse: “Ele era o principal entre os apóstolos, era como que
a boca dos outros discípulos e a cabeça do corpo apostólico… Mostrando-lhe que
doravante ele deve ter confiança, porque todo vestígio da sua negação está
apagado, Jesus confia-lhe o governo de seus irmãos… Diz-lhe: ‘Se me amas, sê o
chefe de teus irmãos’” (Hom. LXXXVIII, in Joan., n. 1). Enfim, aquele que
confirma “em toda obra boa e em toda boa palavra” (2 Tes 2, 16), esse é que
manda a Pedro confirmar seus irmãos.
Bem razão tem, pois, S. Leão
Magno de dizer: “Do seio do mundo inteiro, só Pedro é eleito para ser colocado
à frente do chamamento de todas as nações, e à frente de todos os apóstolos, de
todos os Padres da Igreja; de tal sorte que, embora haja no povo de Deus muitos
pastores, contudo, Pedro rege propriamente todos aqueles que são também
principalmente regidos por Cristo” (Sermo IV, cap. 2). Do mesmo modo, S.
Gregório Magno escreve ao imperador Maurício Augusto: “Para todos os que
conhecem o Evangelho, evidente é que pela palavra do Senhor o cuidado de toda a
Igreja foi confiado ao santo apóstolo Pedro, chefe de todos os Apóstolos… Ele
recebeu as chaves do reino do céu, o poder de ligar e de desligar é-lhe
atribuído, e o cuidado e o governo de toda a Igreja lhe é confiado”
(Epistolarum, lib. V, epist. XX).
O
sucessor de Pedro é o Pontífice Romano.
32. Ora, fazendo essa autoridade parte da constituição e da
organização da Igreja como seu elemento principal, visto ser o princípio da
unidade, o fundamento da segurança e da
duração perpétua, segue-se que de modo algum podia ela desaparecer com o
beato Pedro, mas que devia necessariamente passar aos seus sucessores e ser
transmitida de um a outro. “A disposição da verdade permanece, pois, e o beato
Pedro, perseverando na firmeza da pedra, de quem recebeu a virtude, não largou
o leme da Igreja deixado na sua mão” (S. Leo M., sermo III, cap. 3).
É por isso que os Pontífices que
sucedem a Pedro no episcopado romano possuem de direito divino o poder supremo
na Igreja. “Definimos que a Santa Sé apostólica e o Pontífice romano possuem o
primado sobre o mundo inteiro, e que o Pontífice romano é o sucessor do bem-
aventurado Pedro, príncipe dos Apóstolos, e que ele é o verdadeiro vigário de
Jesus Cristo, o chefe de toda a Igreja, o Pai e o doutor de todos os cristãos,
e que a ele, na pessoa do beato Pedro, foi dado por Nosso Senhor Jesus Cristo o
pleno poder de apascentar, de reger e de governar a Igreja universal; coisa que
está contida também nos atos dos Concílios ecumênicos e nos sagrados cânones”
(Concilium Florentinum). O quarto Concílio de Latrão diz do mesmo modo: “A Igreja
romana… pela disposição do Senhor, possui o principado do poder ordinário sobre
todas as outras Igrejas, na sua qualidade de mãe e mestra de todos os fiéis de
Cristo”.
33. Tal era já antes o sentimento unânime da antiguidade, que, sem
a menor hesitação, sempre considerou e venerou os bispos de Roma como os
sucessores legítimos do beato Pedro. Quem poderia ignorar quão numerosos, quão
claros são sobre este ponto os testemunhos dos santos Padres? É bem evidente o
de Santo Ireneu, que assim fala da Igreja romana: “É a essa Igreja que, por
causa da sua preeminência superior, toda a Igreja deve necessariamente
reunir-se” (Contra Haereses, lib. III, cap. 3, n.º 2).
Cipriano também afirma da Igreja
romana que ela é a “raiz e a mãe da Igreja católica (Epíst. XLVIII, ad
Cornelium, n. 3), a cátedra de Pedro é a Igreja principal, de onde nasceu a
unidade sacerdotal”. Chama-a a “cátedra de Pedro”, porque ela é ocupada pelo
sucessor de Pedro; “a Igreja principal”, por causa do principado conferido a
Pedro e aos seus legítimos sucessores; “a de onde nasceu a unidade”, porque na
sociedade cristã a causa eficiente da unidade é a Igreja romana (Epíst. LIX, ad
Cornelium, n. 14).
Por isso é que S. Jerônimo
escreve nestes termos a Dâmaso: “Falo ao sucessor do pescador e ao discípulo da
cruz… Estou ligado pela comunhão a Vossa Beatitude, quer dizer, à cátedra de
Pedro. Sei que sobre essa pedra está edificada a Igreja” (Epíst. XV, ad
Damasum, n. 2). O método habitual de S. Jerônimo para reconhecer se um homem é
católico, é saber se ele está unido à cátedra romana de Pedro. “Se alguém está
unido à cátedra de Pedro, é meu homem” (Epíst. XVI, ad Damasum, n. 2).
Por método análogo Santo
Agostinho, que declara abertamente que “na Igreja romana sempre se manteve o
principado da cátedra apostólica” (Epíst. XLIII), afirma que todo aquele que se separa da fé romana não é
católico. “Não se pode crer que guardeis a verdadeira fé católica, vós que não
ensinais que se deve guardar a fé romana” (Sermo CXX,n. 13). E do mesmo modo S. Cipriano:
“Estar em comunhão com Cornélio é estar em comunhão com a Igreja católica”
(Epíst. LV, n. 1).
O abade Máximo ensina igualmente
que a marca da verdadeira fé e da verdadeira comunhão é estar sujeito ao
Pontífice romano. “Se alguém quiser não ser herege e não passar por tal, não
procure satisfazer este ou aquele… Apresse-se a satisfazer em tudo a Sé de
Roma. Satisfeita a Sé de Roma, todos em toda parte e a uma só voz
proclamá-lo-ão piedoso e ortodoxo. Porque, se quiserem persuadir os que se
parecem comigo, é em vão que se contentarão de falar, se não satisfizerem e não
implorarem o bem-aventurado Papa da santíssima Igreja dos Romanos, ou seja a Sé
Apostólica”. E eis aqui, segundo ele, a causa e
a explicação desse fato. É que a Igreja romana “recebeu do próprio Verbo
de Deus Encarnado, e, de acordo com os santos Concílios, segundo os santos
cânones e as definições, possui, sobre a universidade das santas Igrejas de
Deus que existem em toda a superfície da terra, o império e a autoridade em
tudo e por tudo, e o poder de ligar e desligar. Porque, quando ela liga e
desliga, o Verbo, que manda às virtudes celestes, liga ou desliga também no
céu” (Defloratio ex Epistola ad Petrum illustrem).
34. Um artigo, pois, de fé
cristã, um ponto reconhecido e observado constantemente, não por uma nação ou por um século, mas por todos
os séculos, e pelo Oriente não menos que pelo Ocidente, era o que, sem suscitar
nenhuma contradição, o sacerdote Filipe, legado do Pontífice romano, relembrava
ao sínodo de Éfeso: “Para ninguém é duvidoso, e é coisa conhecida em todos os
tempos, que o santo e bem-aventurado Pedro, príncipe e chefe dos apóstolos,
coluna da fé e fundamento da Igreja católica, recebeu de Nosso Senhor Jesus
Cristo, Salvador e Redentor do gênero humano, as chaves do reino, e que o poder
de ligar e de desligar os pecados foi dado a esse mesmo apóstolo, que, até o
momento presente e sempre, vive nos seus sucessores e neles exerce a sua
autoridade” (Actio III). Toda gente conhece a sentença do Concílio de
Calcedônia sobre o mesmo assunto: “Pedro falou… pela boca de Leão” (Actio II),
sentença a que a voz do terceiro Concílio de Constantinopla responde como um
eco: “O soberano príncipe dos Apóstolos combatia conosco, porque tivemos em
nosso favor o seu imitador e sucessor na sua Sé… Não se via por fora (enquanto se
lia a carta do Pontífice romano) senão papel e tinta, mas era Pedro quem falava
pela boca de Agatão” (Actio XVIII). Na fórmula de profissão de fé católica
proposta em termos expressos por Hormisdas no começo do século VI e subscrita
pelo imperador Justiniano e também pelos patriarcas Epifânio, João e Menas, o
mesmo é expresso com grande vigor: “Como a sentença de Nosso Senhor Jesus
Cristo que disse: ‘Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja’
não pode ser desprezada… o que foi dito é confirmado pela realidade dos fatos,
visto como, na Sé Apostólica, a religião católica sempre foi conservada sem
nenhuma mácula” (Post Epistolam XXVI, ad omnes Episcopos Hispan., n. 4).
Não queremos enumerar todos os
testemunhos: apraz-nos, todavia, lembrar a fórmula segundo a qual Miguel
Paleólogo professou a fé no segundo Concílio de Lião: “A santa Igreja romana
possui também o soberano e pleno primado e principado sobre a Igreja católica
universal, e reconhece, com verdade e humildade, ter recebido esse primado e
principado, com a plenitude do poder, do próprio Senhor, na pessoa do beato
Pedro, príncipe ou chefe dos Apóstolos, de quem o Pontífice romano é o
sucessor. E, assim como ela é obrigada a defender, antes de todas as outras, a
verdade da fé, assim também, se se elevam dificuldades a respeito da fé, é pelo
julgamento dela que elas devem ser resolvidas” (Actio IV).
b) Também os outros Apóstolos e os Bispos, seus
sucessores, possuem autoridade ordinária.
35. Se o poder de Pedro e dos
seus sucessores é pleno e soberano, não se deve contudo crer que não há outro
poder na Igreja. Aquele que estabeleceu Pedro como fundamento da Igreja também
“escolheu doze dos seus discípulos, aos quais deu o nome de Apóstolos” (Lc 4,
13). Assim como a autoridade de Pedro é necessariamente permanente e perpétua
no Pontificado romano, assim também os bispos, na sua qualidade de sucessores
dos Apóstolos, são os herdeiros do poder ordinário dos Apóstolos, de tal sorte
que a ordem episcopal faz necessariamente parte da constituição íntima da
Igreja. E, posto que a autoridade dos bispos não seja nem plena, nem universal,
nem soberana, nem por isso devemos considerá-los como simples vigários dos
Pontífices romanos, pois eles possuem uma autoridade que lhes é própria, e usam
em toda verdade o nome de prelados ordinários dos povos que governam.
Sob
Pedro e unidos a ele.
36. Mas, como o sucessor de Pedro
é único, ao passo que numerosíssimos são os dos Apóstolos, convém estudar que
laços, de acordo com a constituição divina, unem estes últimos ao Pontífice
romano. E, primeiramente, a união dos bispos com o sucessor de Pedro é de
necessidade evidente e que não pode deixar a menor dúvida; porquanto, se esse
laço se desfaz, o próprio povo cristão
não é mais senão uma multidão que se dissolve e desagrega, e de modo algum não
pode mais formar um só corpo e um só rebanho. “A salvação da Igreja depende da
dignidade do sumo sacerdote: se se não atribuir a este um poder à parte e
elevado acima de qualquer outro, haverá na Igreja tantos cismas quantos
sacerdotes” (S. Hieronymus, Dialog. contra Luciferianos, n. 9).
Eis por que é preciso fazer aqui
uma observação importante. Nada foi conferido aos Apóstolos independentemente
de Pedro; ao passo que várias coisas foram conferidas a Pedro isolada e
independentemente dos Apóstolos. S. João Crisóstomo, explicando as palavras de
Jesus Cristo (Jo 21, 15), pergunta-se “por que é que, deixando de lado os
outros, Cristo se dirige a Pedro”, e responde formalmente: “É que ele era o
principal entre os Apóstolos, como que a boca dos outros discípulos e a cabeça
do corpo apostólico” (Hom. LXXXVIII, in
Joan., n. 1). Com efeito, só ele foi designado por Cristo como
fundamento da Igreja. A ele é que foi dado todo poder de ligar e desligar; só a
ele, igualmente, foi confiado o poder de apascentar o rebanho. Pelo contrário,
tudo o que os Apóstolos receberam, em matéria de funções e de autoridade,
receberam-no conjuntamente com Pedro. “Se a divina bondade quis que os outros
príncipes da Igreja tivessem algo de comum com Pedro, aquilo que ela não tinha
recusado aos outros nunca o deu a eles senão por ele (S. Leo M., sermo IV, cap.
2). Ele sozinho recebeu muitas coisas, porém nada foi concedido a quem quer que
seja sem a sua participação” (Ibid.).
Por onde se vê claramente que os
bispos perderiam o direito e o poder de governar se se separassem conscientemente
de Pedro ou dos seus sucessores. Porque, por essa separação, eles se arrancam a
si próprios do fundamento sobre o qual deve repousar todo o edifício, e são
assim postos fora do próprio edifício; pela mesma razão, acham-se excluídos do
aprisco governado pelo Pastor supremo, e banidos do reino cujas chaves só a
Pedro foram dadas por Deus.
Assim,
por meio de Pedro, se salva a unidade.
37. Estas considerações fazem-nos
compreender o plano e o desígnio de Deus na constituição da sociedade cristã.
Esse plano, ei-lo: O autor divino da Igreja, tendo decretado dar-lhe a unidade
de fé, de governo, de comunhão, escolheu Pedro e seus sucessores para
estabelecer neles o princípio e como que o centro da unidade. É por isto que S.
Cipriano escreve: “Para chegar à fé, há uma demonstração fácil, que resume a
verdade. O Senhor dirige-se a Pedro nestes termos: ‘Digo-te que és Pedro…’ É
sobre um só que ele edifica a Igreja. E, embora após a sua ressurreição ele
confira a todos os Apóstolos um poder igual e lhes diga: ‘Assim como meu Pai me
enviou…’, todavia, para pôr em plena luz a unidade, é num só que ele
estabelece, pela sua autoridade, a origem e o ponto de partida dessa mesma
unidade” (De Unit. Eccl., n. 4). E Santo Optato de Milevo escreve: “Bem sabes,
e não podes negá-lo, que a Pedro em primeiro é que foi conferida a cátedra
episcopal da cidade de Roma: foi lá que se assentou o chefe dos Apóstolos,
Pedro, que, por consequência, foi chamado Cefas. Nessa cátedra única é que
todos deviam guardar a unidade, a fim de que os outros Apóstolos não pudessem
retrair-se cada um isoladamente na sua sé, e que de então por diante fosse
cismático e prevaricador quem elevasse outra cátedra contra essa cátedra única” (De schism. Donat., lib. II).
Daí vem aquela sentença do mesmo S. Cipriano, de que a heresia e o cisma se
produzem e nascem ambos desse fato, de se recusar ao poder supremo a obediência
que lhe é devida. “A única fonte de onde têm surgido as heresias e de onde têm
nascido os cismas, é não se obedecer ao Pontífice de Deus e não se querer
reconhecer na Igreja ao mesmo tempo um só pontífice e um só juiz que ocupa o
lugar de Cristo” (Epíst. XII, ad
Cornelium, n. 5).
Ninguém, pois, pode ter parte na
autoridade se não estiver unido a Pedro, pois seria absurdo pretender que um homem
excluído da Igreja tem autoridade na Igreja. Era por esta razão que Optato de
Milevo repreendia os donatistas: “Foi contra as portas do inferno que, como
lemos no Evangelho, Pedro recebeu as chaves da salvação; Pedro, quer dizer,
nosso chefe, a quem Jesus Cristo disse: ‘Dar-te-ei as chaves do reino dos céus,
e as portas do inferno jamais triunfarão delas’. Como, pois, ousais procurar
atribuir-vos as chaves do reino dos céus, vós que combateis a cátedra de
Pedro?” (Lib. II, n. 4-5).
Logo Pedro (o Pontífice Romano) é
o Príncipe dos Apóstolos (dos Bispos).
38. Mas a ordem dos bispos não
pode ser considerada como verdadeiramente unida a Pedro da maneira como Cristo
o quis, a não ser se for submissa e se obedecer a Pedro; sem o que, ela se
dispersa necessariamente numa multidão onde reinam a confusão e a desordem.
Para conservar a unidade de fé e de comunhão tal como é mister, nem um primado
de honra nem um poder de direção bastam; é preciso absolutamente uma autoridade
verdadeira e ao mesmo tempo soberana, à qual toda a comunidade obedeça.
Realmente, que quis o Filho de Deus quando prometeu as chaves do reino dos céus
só a Pedro? De que as chaves designem aqui o poder supremo, o uso bíblico e o
consenso unânime dos Padres não permitem duvidar. E não se podem interpretar
diversamente os poderes que foram conferidos quer a Pedro separadamente, quer
aos apóstolos conjuntamente com Pedro. Se a faculdade de ligar, de desligar, de
apascentar o rebanho, dá aos bispos, sucessores dos Apóstolos, o direito de
governarem com autoridade verdadeira o povo confiado a cada um deles,
certamente essa mesma autoridade deve produzir o mesmo efeito naquele a quem
foi consignado pelo próprio Deus o papel de apascentar os cordeiros e as
ovelhas. “Pedro não foi estabelecido por Cristo somente pastor, porém pastor
dos pastores. Pedro, pois, apascenta os cordeiros e apascenta as ovelhas;
apascenta os petizes e apascenta as mães; governa os súditos e governa também
os prelados, porque na Igreja, afora os cordeiros e as ovelhas, não há nada”
(S. Brunonis, Episcopi signiensis, Comment. in Joan., part. III, cap. 21, n.
55).
Daí vem nos antigos Padres
aquelas expressões inteiramente à parte que designam o beato Pedro e que o
mostram evidentemente como colocado no grau supremo da dignidade e do poder.
Eles o chamam frequentemente “o chefe da assembleia dos discípulos; o príncipe
dos santos Apóstolos; o corifeu do coro apostólico; a boca de todos os
Apóstolos; o chefe dessa família; aquele que manda ao mundo inteiro; o primeiro
entre os Apóstolos; a coluna da Igreja”.
A conclusão de tudo o que precede
parece achar-se nestas palavras de S. Bernardo ao papa Eugênio: “Quem sois vós?
Sois o sumo sacerdote, o pontífice soberano. Sois o príncipe dos bispos, sois o
herdeiro dos Apóstolos… Sois aquele a quem as chaves foram dadas, a quem foram
confiadas as ovelhas. Outros que não vós também são porteiros do céu e pastores
de rebanhos; mas esse duplo título é em vós tanto mais glorioso, quanto o
recebestes em herança num sentido mais particular do que todos os outros. Eles
têm os seus rebanhos que lhes foram designados; cada um tem o seu; a vós, todos
os rebanhos juntos foram confiados; a vós só, um só rebanho, formado não
somente das ovelhas, mas também dos pastores: vós sois o único pastor de todos.
E me perguntais como eu provo isso. Pela palavra do Senhor. Com efeito, a quem
foi, não digo entre os bispos, porém mesmo entre os Apóstolos, que foram
confiadas assim absoluta e indistintamente todas as ovelhas? Se me amas, Pedro,
apascenta minhas ovelhas. — Quais? os povos de tal ou tal cidade, de tal ou tal
região, de tal reino? Minhas ovelhas, diz ele. Quem é que não vê que ele não
designa algumas, mas que as designa todas a Pedro? Nenhuma distinção, pois,
nenhuma exceção” (De consideratione, lib. II, cap. 8).
Tanto tomados
como indivíduos como
reunidos em corpo,
conforme a testa a Escritura.
39. Seria, porém, afastar-se da
verdade, e contradizer abertamente a constituição divina da Igreja, pretender
que cada um dos próprios bispos, tomado isoladamente, deve estar sujeito à jurisdição
dos Pontífices romanos, mas que não o devem todos os bispos tomados juntos.
Realmente, qual é toda a razão de ser e a natureza do fundamento? É
salvaguardar a unidade e a solidez, muito mais ainda do edifício inteiro do que
de cada uma de suas partes. E muito mais verdadeiro é isto no assunto de que
falamos, porque, pela solidez do fundamento de sua Igreja, Jesus Cristo Nosso
Senhor quis obter este resultado: que as portas do inferno não possam
prevalecer contra ela. Ora, toda gente convém em que essa promessa divina deve
entender-se da Igreja universal, e não das suas partes tomadas isoladamente,
porque, na realidade, estas podem ser vencidas pelo esforço dos infernos, e a
várias delas, tomadas separadamente, tem sucedido serem efetivamente vencidas.
Demais, aquele que foi posto à
frente do rebanho inteiro deve necessariamente ter a autoridade não somente
sobre as ovelhas dispersas, mas sobre todo o conjunto das ovelhas reunidas.
Será que por acaso o conjunto das ovelhas governa e guia o seu pastor? Seriam
os sucessores dos Apóstolos reunidos juntos o fundamento sobre o qual o
sucessor de Pedro deveria apoiar-se para a solidez?
Aquele que possui as chaves do
reino evidentemente tem direito e autoridade não só sobre as províncias
isoladas, mas sobre todas ao mesmo tempo; e, do mesmo modo que os bispos, cada
um no seu território, mandam com verdadeira autoridade não só a cada
particular, porém à comunidade inteira, assim também os Pontífices romanos,
cuja jurisdição abrange toda a sociedade cristã, têm submetidas e obedientes ao
seu poder todas as partes dessa sociedade, mesmo reunidas. Jesus Cristo Nosso
Senhor, como já dissemos bastante, deu a Pedro e aos seus sucessores o encargo
de serem seus vigários e exercerem perpetuamente na Igreja o mesmo poder que
ele próprio exerceu durante a sua vida mortal. Ora, dir-se-á que o colégio dos
Apóstolos sobrepujava em autoridade seu Mestre?
E
a mesma Igreja atesta.
40. Esse poder, de que falamos,
sobre o próprio colégio dos bispos, poder que as Santas Letras enunciam tão
abertamente, a Igreja nunca cessou de reconhecê-lo e de atestá-lo. Eis aqui,
sobre este ponto, as declarações dos Concílios: “Lemos que o Pontífice romano
julgou os prelados de todas as Igrejas; mas não lemos que ele tenha sido
julgado por quem quer que seja” (Hadrianus II, in Allocutione III ad Synodum
Romanam an. 869. Cf. Actionem VII Concilii Constantinopolitani IV). E a razão
deste fato está indicada, e é que “não há autoridade superior à autoridade da
Sé Apostólica” (Nicolaus in epist. LXXXVI, ad Michael. Imperat. — “Patet
profecto Sedis Apostolicae, cuius auctoritate major non est, judicium a nemine
fore retractandum, neque cuiquam de ejus liceat judicare judicio”).
É por isso que Gelásio assim fala
dos decretos dos Concílios: “Do mesmo modo que aquilo que a primeira Sé não
aprovou não pôde ficar em vigor, assim também, ao contrário, aquilo que ela
confirmou pelo seu juízo por toda a Igreja foi recebido” (Epíst. XXVI, ad
Episcopos Dardaniae, n. 5). De feito, ratificar ou infirmar as sentenças ou os
decretos dos Concílios sempre foi próprio dos Pontífices romanos. Leão Magno
anulou os atos do conciliábulo de Éfeso; Dâmaso rejeitou os de Rímini; Adriano
I, os de Constantinopla; e o vigésimo oitavo cânon do Concílio de Calcedônia,
por estar desprovido da aprovação e autoridade da Sé Apostólica, ficou, como se
sabe, sem vigor e sem efeito. Foi, pois, com razão que, no quinto Concílio de
Latrão, Leão X baixou este decreto: “Resulta manifestamente, não só dos
testemunhos da Escritura Sagrada, das palavras dos Padres e dos outros
Pontífices romanos e dos decretos dos
santos cânones, mas ainda da confissão formal dos próprios Concílios, que só o Pontífice romano, segundo o tempo em
que ele está em cargo, tem pleno direito e poder, como tendo autoridade sobre
todos os Concílios, para convocar, transferir e dissolver os Concílios”. As
Santas Letras atestam bem que as chaves do reino dos céus foram confiadas só a Pedro, e também que o poder de
ligar e de desligar foi conferido aos Apóstolos conjuntamente com Pedro; mas de
quem teriam os Apóstolos recebido o soberano poder sem Pedro e contra Pedro?
Testemunho algum no-lo diz. Certamente, não foi de Jesus Cristo que o
receberam. Eis por que o decreto do Concílio do Vaticano, que definiu a natureza e o alcance do primado do Pontífice
romano, não introduziu uma opinião nova, mas afirmou a antiga e constante fé de
todos os séculos (Sess. IV, cap. 3).
Desta duplicidade de poder não se origina nenhuma
confusão na administração.
41. E não se deve crer que a
submissão dos mesmos súditos a duas autoridades acarrete a confusão da
administração. Tal suspeita é-nos vedada primeiramente pela sabedoria de Deus,
pois foi ele próprio quem concebeu e estabeleceu a organização desse governo.
Ademais, cumpre notar que o que perturbaria a ordem e as relações mútuas seria
a coexistência, numa sociedade, de duas autoridades do mesmo grau, das quais
nenhuma fosse sujeita à outra. Mas a autoridade do Pontífice romano é soberana,
universal e plenamente independente. “O inconveniente seria que dois pastores
fossem estabelecidos com grau igual de autoridade sobre o mesmo rebanho. Mas
que dois superiores, um dos quais está acima do outro, sejam estabelecidos
sobre os mesmos súditos, não é um inconveniente; e dessarte é que o mesmo povo
é governado imediatamente pelo padre da paróquia, pelo bispo e pelo Papa” (S.
Thomas,in IV Sent., dist. XVII, a. 4, ad q. 4, ad 3).
Aliás, os Pontífices romanos,
sabendo o seu dever, querem mais do que ninguém a conservação de tudo o que foi
divinamente instituído na Igreja: e é por isso que, assim como com o zelo e a
vigilância necessários eles defendem o direito do seu próprio poder, assim
também têm posto e porão constantemente todos os seus desvelos em salvaguardar
a autoridade dos bispos. Muito mais: tudo o que de honra e de obediência é
tributado aos bispos, eles o consideram como sendo tributado a eles mesmos.
“Minha honra é a honra da Igreja universal. Minha honra é o pleno vigor da
autoridade de meus irmãos. Só me sinto verdadeiramente honrado quando se rende
a cada um deles a honra que lhe é devida” (Gregorius M.Epistolarium lib. VIII,
epist. XXX, ad Eulogium).
CONCLUSÃO
Tende
Deus como Pai e a Igreja como Mãe.
42. Em tudo o que precede,
fielmente traçamos a imagem e exprimimos os traços da Igreja consoante a sua
divina constituição. Insistimos sobre a sua unidade; mostramos bastante qual é
a natureza desta e por que princípio quis o seu divino Autor assegurar-lhe a
manutenção.
Todos aqueles que, por insigne
benefício de Deus, têm a felicidade de haver nascido no seio da Igreja Católica
e de aí viver, ouvirão — nenhuma razão temos para duvidar disto, — a Nossa voz
apostólica. “Minhas ovelhas ouvem a minha voz” (Jo 10, 27). Eles terão achado
nesta carta com que se instruírem mais plenamente e se apegarem com amor mais
ardente, cada um aos seus próprios pastores e por estes ao pastor supremo, a
fim de poderem mais seguramente permanecer no redil único, e colher uma maior
abundância de frutos salutares.
Mas, “fitando Nossos olhares no
autor e consumador da fé, em Jesus” (Heb 12, 2), cujo lugar ocupamos e cujo
poder exercemos, por mais fraco que sejamos para o peso dessa dignidade e desse
cargo, sentimos a sua caridade inflamar-Nos a alma, e dessas palavras, que
Jesus Cristo dizia de si mesmo, apropriamo-Nos não sem razão: “Tenho outras
ovelhas que não são deste aprisco; importa também que eu as traga, e elas
ouvirão a minha voz” (Jo 10, 16). Não recusem, pois, escutar-Nos e mostrar-se
dóceis ao Nosso amor paternal todos aqueles que detestam a impiedade hoje em
dia tão espalhada, que reconhecem a Jesus Cristo, que o confessam Filho de Deus
e Salvador do gênero humano, mas que, no entanto, vivem errantes e afastados de
sua Esposa. Os que tomam a Cristo, cumpre que o tomem todo. “Cristo todo é uma
cabeça e um corpo: a cabeça é o Filho único de Deus; o corpo é a sua Igreja: é
o esposo e a esposa, dois numa só carne. Todos os que têm para com a cabeça
sentimento diferente do das Escrituras Santas, por mais que se achem em todos
os lugares onde está estabelecida a Igreja, não estão na Igreja. E, do mesmo
modo, todos os que pensam como a Escritura Sagrada a respeito da cabeça, mas
que não vivem em comunhão com a unidade da Igreja, não estão na Igreja” (S.
Augustinus, Contra Donatistas Epistola, sive de Unit. Eccl., cap. IV, n. 7).
43. E é também com igual ardor
que Nosso coração se volve para aqueles que o sopro contagioso da impiedade ainda
não envenenou inteiramente, e que têm ao menos o desejo de ter por pai o Deus
verdadeiro, criador da terra e do céu. Reflitam eles e compreendam bem que de
modo algum podem estar no número dos filhos de Deus se não vierem a reconhecer
por irmão Jesus Cristo e por mãe a Igreja. É, pois, a todos que dirigimos, com
grande amor, estas palavras tiradas de Santo Agostinho: “Amemos o Senhor nosso
Deus, amemos a sua Igreja: ele como um pai, ela como uma mãe. Ninguém diga:
Sim, ainda vou aos ídolos, consulto os possessos e os feiticeiros, mas no
entanto não deixo a Igreja de Deus: sou
católico. Ficais preso à mãe, mas ofendeis o pai. Outro diz semelhantemente:
Deus me livre; não consulto os feiticeiros, não interrogo os possessos, não
pratico adivinhações sacrílegas, não vou adorar os demônios, não sirvo a deuses
de pedra, mas sou do partido de Donato. De que vos serve não ofenderdes o pai,
se ele vingará a mãe a quem ofendeis? De que vos serve confessardes o Senhor,
honrardes a Deus, louvá-lo, reconhecer seu Filho, proclamar que ele está
sentado à direita do Pai, se blasfemais a sua Igreja? Se tivésseis um protetor
a quem prestásseis todos os dias os vossos deveres, e se viésseis a lhe
ultrajar a esposa por uma acusação grave, ousaríeis ainda entrar na casa desse
homem? Conservai-vos, pois, meus bem-amados, conservai-vos todos unanimemente
apegados a Deus vosso pai e a vossa mãe a Igreja” (Enarratio in Psalm.
LXXXVIII, sermo II, n. 14).
Confiando grandemente na
misericórdia de Deus, que pode tocar poderosissimamente os corações dos homens,
e forçar as vontades, mesmo rebeldes, a virem a ele, muito instantemente
recomendamos à sua bondade todos aqueles que a Nossa palavra visou. E, como
penhor dos dons celestes e em testemunho da Nossa benevolência, concedemo-vos
com grande amor no Senhor, a vós, Veneráveis Irmãos, ao vosso clero e ao vosso
povo, a Bênção Apostólica.
Dado em Roma, junto a S. Pedro,
no dia vinte e nove de Junho do ano de 1896, décimo nono do Nosso pontificado.
LEÃO XIII, PAPA.
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