São
Vicente de Lérins (Século V)
Perguntando eu com toda a
atenção e diligência a numerosos varões, eminentes em santidade e doutrina, que
norma poderia achar segura para distinguir a verdade da fé católica da
falsidade da heresia, eis a resposta constante de todos eles: quem quiser
descobrir as fraudes dos hereges nascentes, evitar seus laços e permanecer
íntegro na sadia fé, há de resguardá-la, sob o duplo auxílio divino: primeiro,
com a autoridade da lei divina e segundo com a tradição da Igreja católica.
Ao
chegar a este ponto, talvez pergunte alguém: sendo perfeito como é o cânon das
Escrituras e suficientíssimo por si só para todos os casos, que necessidade há
de se acrescentar a autoridade da interpretação da Igreja? A razão é que,
devido à sublimidade da Sagrada Escritura, nem todos a entendem no mesmo
sentido, mas cada qual interpreta à sua maneira as mesmas sentenças, de modo a
se poder dizer que há tantas opiniões quantos intérpretes.
De uma maneira a
expõe Novaciano, diversamente Sabélio, Donato, Ário, Eunômio, Macedônio; de
outra forma Fotino, Apolinário, Prisciliano; de outra, ainda, Joviniano,
Pelágio, Celéstio ou Nestório. Portanto, é necessário que, em meio a tais
encruzilhadas do erro, seja o sentido católico e eclesiástico o que assinale a
linha diretriz na interpretação da doutrina dos profetas e apóstolos. E na
própria Igreja Católica deve-se procurar a todo custo que nos atenhamos ao que,
em toda a parte, sempre e por todos foi professado como de fé, pois isto é
próprio e verdadeiramente católico, como o diz a índole mesma do vocábulo, que
abarca a globalidade das coisas. Ora obte-lo-emos se seguirmos a
universalidade, a antigüidade e o consentimento. Pois bem: seguiremos a universalidade
se professarmos como única fé a que é professada em todo o orbe da terra pela
Igreja inteira; a antigüidade, se não nos afastarmos do sentir manifesto de
nossos santos pais e antepassados; enfim, o consentimento, se na mesma
antigüidade recorrermos às sentenças e resoluções de todos ou quase todos os
sacerdotes e mestres
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